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domingo, 19 de abril de 2015

A Carta Mestre


O mago, nos últimos anos, veio publicando uma série de livros e os seus livros vendiam desenfreadamente. As pessoas não conseguiam compreender o que tinha em seus livros de tão especial, porque o seu vocabulário era bem simples e não havia nada de extraordinário; nenhuma técnica. Eram livros simples com estórias simples. Mas que vendiam, que conquistavam público.

O mago deixava bem claro a todos ser magia, mas isso não satisfazia a ânsia do menino. O menino sabia que tinha algo a mais, que tinha algum segredo. O menino queria conhecer esse segredo também, porque, se pudesse fazer algo parecido, teria uma vida tranquila. Poderia viver de sua arte e estar livre das cobranças exigentes dos patrões das empresas e das firmas. O menino sabia, conforme observava em sua família, que era isso que deixava as pessoas carregadas de estresse. Não tinham tempo para viver as suas paixões e ainda tinham que aturar um amontoado de exigências que os afastavam cada vez mais delas.

O menino gostava de cantar, tinha um talento musical que parecia inato. Desde que começou a praticar, sua voz e habilidade para o instrumento se desenvolveram com facilidade. Gostava de compor umas musiquinhas, que geralmente mandava para as garotas com quem se apaixonava. Imaginou que se conseguisse a mesma magia que conquistava todo mundo, poderia fazer o mesmo que o mago havia feito com os livros, só que para a música. Então foi perguntar ao mago pessoalmente.

O mago disse que era magia, como dizia para todos. Mas o menino insistiu e ficou enchendo a sua paciência dia após dia: "ah vai, me conta... me conta, por favor!" Mas o mago não contava. Era um segredo da magia. Não iria revelá-lo a qualquer um só por um fruto de uma curiosidade.

O menino continuou insistindo, e insistindo incansavelmente. Quanto mais o mago negava, mais ele queria saber, mais o seu interesse crescia. O mago percebeu que era verdadeiro, que o garoto queria mesmo conhecer o segredo e não apenas matar uma curiosidade. Talvez fosse um herdeiro da magia e estivesse errando em não revelá-lo. Decidiu contar.

- Olha, o segredo da magia é ter a "Carta Mestre". A Carta Mestre toma a forma dela, pela vontade dela, e o mago só a leva adiante.

- E como eu faço para tê-la? - perguntou o menino.

- O caminho não é muito complicado... No mundo da magia, nós ensinamos aos discípulos a atingir um estado livre de influências. Não é um estado positivo, é um estado negativo. É um estado que não tem direção alguma, um estado de plena neutralidade. É um estado que nasce da negação de todos os impulsos direcionados a algo ou alguém. É um estado que não tem objetivo algum. Nesse estado, alguma coisa acontece com o homem e começa a conduzi-lo. Essa condução o levar a criar coisas, porque há um potencial criativo que nasce dessa neutralidade. Esse potencial criativo é a Carta Mestre. Ela cria algo que, por não ter direção alguma, acaba atingindo todas as direções ao mesmo tempo. É o coringa da magia.

- Não pense que é fácil tomar posse da Carta Mestre - disse o mago -, poucos conseguem e isso é bom. A magia é feita por alguns para ser usufruída por muitos. É assim que funciona. Muitos podem buscá-la, mas só os verdadeiros a conquistam. Não é fácil porque requer completa dedicação do aspirante. Ele precisa negar a própria vida, morrer completamente para tudo. Só então ele renasce no estado neutro. Nesse renascimento, a Carta vem junto. O renascimento é a conquista do baralho.




~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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