Depois de um ano aprendendo magia, o menino já se sentia bem mais confiante. Encarava os desafios, os medos, e tinha mais coragem para lidar com os aspectos da vida. Ia em busca de suas paixões, jamais ficando no amor platônico, por mais corajoso que o seu ato tivesse que ser. Às vezes se sentia um guerreiro, combatendo o seu inimigo "medo". O mago falou a ele que a paixão é rica em magia. Que se ele a seguisse, poderia encontrar a porta para o outro mundo.
Mas todo dia o menino estava aparecendo na torre do mago, nervoso. Chegava jogando as coisas com força, fazendo cara feia, falando de modo grosseiro. O mago amava aquele menino mais do que a própria vida. Se é que isso era possível, ficava mais irritado do que ele. Já tinha passado por todos os tropeços da paixão. Sabia que, naquele estado que o menino estava, só poderia ser uma garota. E do tipo serpente. O menino estava preso numa armadilha. A pior armadilha que se pode ficar preso: a paixão pela serpente venenosa.
O mago foi até o sofá - onde o menino estava encostado com os braços apoiados aos joelhos e segurando a cabeça quente -, e sentou ao seu lado. Colocou a mão nas costas dele e disse:
- A gente precisa conversar sobre um assunto muito sério.
Por mais irritado que o menino pudesse estar, era impossível ouvir aquelas palavras e não se dispersar completamente de qualquer coisa que estivesse se passando na mente. A curiosidade, ainda mais naquele menino, sempre falava mais alto.
- Eu te falei que você deve seguir a paixão - disse o mago -, falei que ela pode se tornar uma porta para o outro mundo; mas você não pode esquecer que o queijo pode ser dado como um presente doce, com um delicioso sabor; ou que ele pode ser colocado em cima de uma ratoeira, onde te manterá um prisioneiro.
- ?... - o menino não entendeu.
- O que eu quero dizer é que, principalmente em se tratando da paixão, o homem deve tapar os olhos e ouvir a intuição. A intuição sempre fala a verdade. Por mais que o homem não confie no que os seus instintos estão dizendo, porque são invisíveis e não usam de fatos, eles estão contando a verdade.
- Por exemplo - o mago prosseguiu -, vamos considerar o caso de duas irmãs gêmeas. Duas princesas... duas meninas extremamente lindas. Uma delas tem um coração cheio de amor, um coração que seguiu o caminho da luz; e a outra tem um coração cheio de ódio, um coração que optou pela escuridão. A pele é a mesma: uma beleza gigantesca. Mas por dentro elas são completamente diferentes.
- Elas têm o mesmo sotaque, o mesmo jeito de falar, o mesmo vocabulário; porque são irmãs, moram no mesmo lugar, e estão sempre por perto. Você é seduzido por ambas, porque tem um coração apaixonado e ama as garotas.
- Caído na sedução da gêmea luz, tudo o que vier dela será um preenchimento para você. Suas palavras te enriquecerão e o seu jeito de agir fará com que você se sinta abençoado, elevado ao alto. Caído na sedução da gêmea escuridão, acontecerá quase que o inverso disso. Suas palavras te machucarão e o seu jeito de agir fará com que você sinta um vazio profundo, uma grande dor. Elas duas estão fazendo as mesmas coisas. Te dando carinhos, beijos e dizendo que te ama. Mas o que você está recebendo em resposta interna de cada uma, é diferente.
- É por aí que você deve se guiar. Pela resposta interna, e não pelo que vê. As serpentes podem morder você no mesmo lugar, mas o que entrará no seu corpo poderá ser diferente. Em uma, pode vim o elixir; na outra, pode vim o veneno. Ambos são verdes. Um cura. O outro destrói.
~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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