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terça-feira, 12 de maio de 2015

A Armadilha do Mestre


O menino virou discípulo de um grande mestre, que já tinha iluminado centenas de pessoas ao longo da vida. Era um homem experiente, que sabia o que fazia; então podia confiar nele. O seu primeiro ensinamento foi bem simples. Ele disse:

"Afaste-se da sociedade e fique sozinho. É desse jeito que encontrarás o iluminado caminho."

O menino obedeceu ao mestre e se afastou de tudo. Era o ensinamento. Havia se tornado um discípulo e já sabia como funcionava a tradição. Se quisesse mesmo obter a iluminação, se quisesse ser o novo mestre, teria que seguir o ensinamento por mais louco que fosse. 

Largou os cursos que fazia, os grupos que frequentava; parou de sair. Finalizou os namoros, rompeu as amizades, trancou a faculdade e abraçou a sua fria solidão. Ficou completamente só. Tudo isso só para seguir o ensinamento do mestre. Queria se tornar iluminado. Queria ser o mestre.

No começo, se sentiu bastante alegre. Ao seguir o ensinamento, uma calorosa esperança tomava conta. Estava seguindo o ensinamento de um grande mentor, então sabia que logo mais estaria vivendo a iluminação. Mas o tempo foi passando e começando a sentir falta de tudo aquilo o que já havia abandonado. Não era para ser assim, tinha certeza absoluta disso. Isso não era a iluminação. A iluminação era uma paz, e não uma saudade. Foi visitar o mestre de novo.

O mestre lhe deu um novo ensinamento:

- Agora você vai observar os seus desejos e os seus pensamentos, de forma passiva, sem interferir em nenhum deles. Você não é o que pensa, você é a consciência por trás do pensamento. Negue-se a si mesmo.

Agradeceu à generosidade de seu mestre e foi embora. Tinha uma nova tarefa a concluir e estava agora mais perto de encontrar o seu caminho. Toda vez que sentia a saudade, tudo o que precisava fazer era observar os pensamentos que surgiam com ela e depois negá-los. Era simples. Eram só pensamentos e nada mais. Apenas ondas no mar de sua consciência. Do mesmo jeito que estavam vindo, estariam indo embora. 

Adquiriu um alto grau de consciência com essa investigação. O desejo já não podia mais passar despercebido, já não podia mais enganá-lo. Assim que surgia, era visto; reconhecido pelo que era. Mas a saudade das coisas do mundo, por mais estranha que fosse, continuava se prolongando. Pior do que isso, aumentando. Foi visitar o mestre outra vez.

- Muito bem, você compreendeu a lição. Agora o seu novo trabalho será abandonar todos esses desejos, de uma só vez. Se quiser ser um mestre, terá que renascer em espírito. Entregue-se totalmente e encontrarás a luz.

Voltou para casa. Mais um passo vencido! Mais um ensinamento cumprido. Seu mestre o elogiou, estava feliz com isso. Sabia que quando o mestre elogia, é porque estava mesmo sendo um bom discípulo. A partir de agora, jogaria fora tudo o que era de seu desejo. Era simples e o mestre estava certo. Não podia ser um ser iluminado se ainda estava desejando por algo. Desejava estar com pessoas, desejava viver ao lado delas; mas tudo isso eram apenas coisas da carne. Precisava se livrar de todas essas coisas para renascer em espírito. Seu mestre não tinha desejos, e era por isso que era um mestre. Precisava ser como ele.

Quanto mais abandonava os desejos, quanto mais lutava contra eles, quanto mais os negava; mais eles vinham com força, brigando também. Estavam ficando mais fortes, mais intensos. Contrariá-los se tornou uma tarefa muito dura. Dava dor de cabeça. Era uma tortura. Queria muito voltar à sociedade, voltar a viver com os outros; mas tinha que rejeitar todas essas coisas. Algo estava errado. Era para estar se iluminando com o ensinamento, e não desejando cada vez mais e tendo que lutar contra isso. Voltou ao mestre.

Contou a ele como estava sendo difícil se livrar dos desejos. Disse que se sentia um fracassado, que não merecia a iluminação. Que tudo o que conseguiu fazer durante todo esse tempo foi desejar ainda mais tudo aquilo o que não queria estar desejando agora.

Seu mestre ouviu atentamente ao seu discurso. Depois deu um sorriso, um beijo no seu rosto, e disse:

- Não tenho mais nada a lhe dizer, então isso é um adeus. O nosso trabalho acabou.

"O quê?! Como assim? Não podia ser. Ainda não tinha atingido a iluminação, estava cheio de desejos. Do que é que o seu mestre estava falando? Era óbvio que lhe faltava algo a aprender. O mestre não podia abandoná-lo agora."

- Você já descobriu tudo o que tinha que descobrir, tudo o que tem importância e valor em sua experiência. Já desvendou o mistério do seu coração. Agora é hora de correr atrás de tudo isso e esquecer toda essa história de iluminação. Os iluminados são aqueles homens seguros, que sabem quem são, que sabem o que querem. São os homens que se conhecem. 

- O trabalho de um mestre é te desviar do mundo até conseguir fazer você se conhecer. É uma estratégia. O mestre não pode fazer isso por você, então tem de persuadi-lo de alguma maneira. Antes do ensinamento, você não tinha certeza do que queria. Ficava todo confuso. Era facinho alguém chegar e te influenciar, levando você, te fazendo desviar do seu caminho. Qualquer um tinha esse poder. Agora você tem certeza do que quer, então ninguém mais pode confundi-lo. Você é o dono de si mesmo.

- O mestre não é um guia. Ele é uma armadilha. Se você ficar seguindo-o a vida inteira, ficará a vida inteira preso nela. Ficará entrando e saindo da mesma armadilha o tempo todo. Você poderá até acabar sentindo um prazer em ficar preso, se acomodando nos braços do mestre. Mas isso não é a iluminação. A iluminação é quando você mesmo se tornou o seu guia. Então você não precisa mais de mestre nenhum. É isso o que significa a liberdade.
 




~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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