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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O Medo da Solidão



     Ele era um rapaz muito popular e estava terminando de cursar a faculdade. Sempre estava rodeado de amigos e de pessoas, então raramente ficava só.
     Logo que terminou a faculdade, uma grande empresa o contratou para um trabalho em que ele viajaria o mundo inteiro. Ele era um ótimo aluno, tirava boas notas e tinha um excelente currículo. Era um destaque, e isso atraiu os olhos daquela grande empresa.
     Ele estava muito contente, sempre quis viajar o mundo; era um oportunidade única. Ele ia conhecer lugares novos, pessoas novas, novas línguas; estava adorando a ideia.
     Então ele se formou na faculdade e já saiu empregado. Assinou um contrato de dois anos com a empresa. Logo que se formou, se despediu dos amigos e família, e então viajou.
     Ele passava um mês em cada lugar diferente, conhecendo lugares maravilhosos e ficando em lindos hotéis. Ele estava muito orgulhoso, tirava muitas fotos e sempre ligava para os amigos e família contando sobre suas viagens. Ele sabia que era uma oportunidade única, que raros têm... Então ele celebrava contente.
     Ele se deliciava nos hotéis. Caminhava pelas cidades, vendo novas paisagens e comendo diferentes tipos de comida. Além disso tudo, estava ganhando uma ótima grana, e estava fazendo uma boa reserva. Era tudo que alguém poderia querer ter, e ele sabia disso.

     Depois de seis meses, começou a acontecer algo estranho... Ele sabia que deveria agradecer e que era abençoado, todo mundo lhe dizia isso. Mas ele não estava se sentindo grato, pelo contrário, estava se sentindo só, vazio.
     Sempre que entrava em seu quarto de hotel, uma sombra descia repentinamente sobre ele e ele se assustava. Sentia medo. Então ele saía do hotel e corria para longe daquela sombra. Procurava alguma coisa para fazer, algum lugar para visitar, alguém para conhecer... Qualquer coisa que o fizesse desviar da sombra.
     Mas aquela sombra não o deixava quieto. Andava com ele para onde quer que ele fosse, como um parasita. Ao mero sinal da sombra, do vazio, ele corria. Escapava da sombra como um boi escaparia do matadouro.
     Se não houvesse o que fazer, ele corria para o telefone, ligava para alguém, ou, caso não houvesse a quem ligar, ele corria para as redes sociais.

     Mas a sombra foi se tornando cada vez mais audível e menos invisível; era cada vez mais difícil escapar dela.
     Quando ele voltava para sua casa, depois de longas viagens, ele se sentia um pouco melhor. Estar com a sua família parecia que afastava a sombra. Mas ele sabia que ela estava lá, sabia que mais cedo ou mais tarde ela iria dar as caras.
     Então vinha a hora de uma nova sequência de viagens e ele se apavorava. Tinha certeza absoluta que a sombra o iria fazer companhia. Mas ele tinha que ir...

     Então ele viajou novamente, e viajou novamente, e novamente. A sombra sempre vinha e ele sempre corria. Numa dessas fugas, ele pensou que comprar um livro poderia ser uma boa saída. Então ele foi à livraria.

     Percorrendo as prateleiras... Ficção... Religião... Historinhas infantis - ele se deu um pouco de tempo nessa seção, adorava crianças -... Geografia... História... Auto-ajuda - ele parou aqui. Algo despertou sua atenção.
     Havia um livro roxo, com letras brilhantes no título, que estava intitulado: "Encare a solidão, encontre a paz sem razão".

     Paz? Solidão? Aquilo tinha muito a ver com ele, sua solidão não o estava deixando ter paz, ele precisava estar sempre escapando dela.
     Ele comprou o livro e foi para o hotel, sentindo uma ligeira curiosidade, então foi com pressa. "Paz sem razão?", "Paz?"; era tudo o que ele precisava. Ele vivia sempre na hora do rush, tendo que fugir de si mesmo para não entrar em conflito existencial e desabar. Aquele livro parecia ter alguma resposta.
     Chegou então em casa e começou a devorar o livro. O livro dizia assim:

     "Fomos ensinados a escapar da solidão, como se ela fosse um monstro apavorante. Ela parece mesmo um monstro apavorante, pois nos conhecemos, e quando a solidão bate à porta, tudo aquilo que sabemos sobre nós mesmos parece não ter importância e valor nenhum. Isso gera muito medo, um grande medo.
     Mas isto é só uma falta de compreensão, pois, na solidão, existe uma qualidade de infinitude que transforma a pessoa em algo muito maior do que aquilo que ela já é. O medo não é sem razão, o medo vem da essência pessoal que reconhece, intuitivamente, que irá desaparecer se a solidão invadir. Não tenha medo, a solidão precisa invadir e te possuir. Permita que ela seja, que entre em você. 
     A solidão carrega uma qualidade divina, a mesma qualidade que você pode ter uma diminuta amostra quando olha para o céu estrelado. Ou quando chega em cima de uma montanha e avista o horizonte. Ou quando navega no mar e observa aquela imensidão... São pequenas amostras. A solidão carrega a essência dessa amostragem, que é infinitamente maior e mais abrangente do que ela.
     O medo que vem com a solidão, não é um medo qualquer. É um medo de morte. Porque a solidão, ao primeiro ver, aparenta ser uma morte. E é, de fato. A solidão é um chamado, um chamado de morte. Mas isso não é ruim. Isso é magnífico. A solidão faz você morrer para o que você era e renascer para algo infinitamente maior. Eu uso a palavra infinito, mas ainda é uma palavra pequena. Porque não há como expressar aquilo que a solidão trás. Você descobre uma paz que excede toda a compreensão possível de ser colocada em palavras.
     Isso só acontece quando você mergulha intensamente na solidão. Então, amigo, será você quem estará escrevendo este livro, pois entenderá algo tão inominavelmente grande, que compreenderá quase tudo o que acontece no planeta terra. Compreenderá todo o sofrimento, toda a tristeza, toda a angustia e toda dor. Saberá porque elas ocorrem, e ocorrem porque as pessoas estão correndo da infinitude imensamente alimentadora e preenchedora que a solidão em si carrega. Estão correndo do infinito.
     Então você estará escrevendo este livro para resgatar sua mãe, seu tio, seu irmão, seu primo, o mendigo, o desconhecido, o amigo e o inimigo. Estão todos sofrendo com o universo nas mãos. São pobres a um passo da riqueza. Sentem fome com comida na mesa."


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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