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sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O Louco que viu Deus



     Um rapaz normal, um pouco inteligente, mas nada demais.
     Durante toda a sua juventude, sempre fora um menino cético. Seus pais rezavam, falavam de Deus, de Jesus, e ele sempre dizia que não acreditava em nada disso.
     Logo ao atingir a maioridade, numa manhã qualquer de domingo, ele amanheceu diferente. Estava anormalmente sorridente.
     Seus pais estranharam e perguntaram o que é que ele tinha.
     Ele disse:
     - Eu vi Deus, ele existe.
     Sua mãe falou:
     - Está vendo, eu sabia que isso ia acontecer. Um dia, todo mundo encontra Deus.
     Ele retrucou:
     - Não, mãe, você não entendeu... Eu vi mesmo Deus. Eu não passei a acreditar nele, eu o vi. Ele falou comigo.

     Sua mãe passou a mão na cabeça dele, como quem não tinha visto nada demais na afirmação, e, sorridente, disse:
     - Está bem meu filho, hehe. É assim mesmo.

     Depois de alguns meses, o garoto começou a ficar diferente; mais calado, mais quieto.
     Sempre que conversava com sua família, ele dizia que estava recebendo sinais, vários sinais.
     Sua família chegou a achar que ele tinha enlouquecido; mas ele insistia em dizer que não era loucura, que era mesmo verdade.
     Ele contava que ele recebia sinais, a toda hora, coincidências que, de tão intensas, eram até difíceis de acreditar.

     Anos depois, ele ficou pior. Não conversava mais e nem respondia a noventa porcento das pessoas que falavam com ele.
     Seus pais ficaram realmente preocupados, mas respeitavam a vontade do garoto. Ele não queria conversar e estava claro que era ele quem houvera decidido assim, então tudo bem, deixa ele.
     Com o tempo, o garoto surtou de verdade.
     Um dia, ele estava na sala, com um olhar distante, e sua mãe, curiosa, perguntou:
     - Filho, o que você tem?
     Ele respondeu:
     - Mãe, eu sou Deus.

     A mãe dele quase endoida quanto escutou isso, parecia um insulto.
     - Filho, ninguém pode ser Deus, só existe um Deus, e ele é Jesus.
     Seu filho respondeu:
     - Se Jesus é Deus, e só existe um Deus; então eu sou Jesus.

     É óbvio que ninguém levou fé no que ele disse. Sua família já suspeitava que ele era meio louco, então isso nem os preocupou. Ora bolas, era apenas parte de sua mente maluquinha. 
     Então não havia problema, ninguém se incomodou. Resolveram deixar para lá.

     Nos próximos meses, o garoto fez um silêncio profundo e não dizia mais nem uma palavra sequer. Além disso, agora ele houvera se trancado no quarto. Só saia de lá para comer, para tomar banho, para ir ao banheiro, ou quando não havia ninguém em casa.
     Fora isso, ele permanecia no quarto, sozinho.

    Depois de dois anos assim, sem sair do quarto, sua mãe se preocupou. Um dia, quando ele saiu para um café, sua mãe, não resistindo de curiosidade, o perguntou:

     - Filho, você não sai do quarto. Você não se sente mal não? A vida toda passando lá fora e você sempre aí, sem fazer nada.
     O garoto respondeu:
     - Mãe, eu raramente estou no quarto. Só as vezes que eu fico lá. O corpo sim, ele pode estar lá, mas eu não estou.
     Sua mãe, obviamente, não entendeu. Seria a maluquice dele?
     - Filho, o que você quer dizer?
     - Mãe, eu estou por aí. Vagando para lá e para cá. Mexendo uma peça aqui, outra peça ali; preparando o terreno para a subida deste corpo. Antes mesmo de eu me descobrir, eu já estava trabalhando, depois apenas passei a observar isso. Estou trabalhando o tempo todo, em tempo integral. Só paro no quarto para descansar e olhe lá! As vezes, continuo trabalhando mesmo descansando, mesmo dormindo...


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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A Torre do Crescimento



     Uma torre começou a crescer no centro da cidade.
     No começo, ela era pequenininha e ninguém olhava para ela. Mas, depois que ela atingiu um tamanho considerável, ela começou a chamar atenção e então surtou e cresceu desenfreadamente.
     Ela não parava de crescer, parecia infinita. Ela tinha chegado tão alto, que atraiu a atenção dos pássaros do céu.
     Eles passavam por lá e observavam aquela torre, alta. Então, pousavam ali mesmo, para descansar nas alturas.
     Não havia nada tão alto como aquela torre em que eles pudessem pousar e repousar. Pousar naquela altura era então novidade para eles.
     Quando a torre já estava alta o suficiente, quando já estava atravessando as nuvens; uma placa surgiu na parte de fora dela, perto da base, e a placa convidava: "Venha, visite a torre, você descobrirá algo incrível."
     O pessoal da cidade começou a ficar muito curioso. Aquela torre era diferente, o que é que ela tinha?
     Então, um pouco apreensivos, os primeiros curiosos começaram a se aproximar e a entrar na torre.
     Meses depois, eles saíam de lá. Saíam com um brilho diferente no olhar; falando diferente, confiantes, sábios e maduros. As pessoas observavam aquilo e não podiam acreditar. O que aconteceu? Eles mudaram da água para o vinho!

     - O que aconteceu com vocês? - O pessoal perguntava.
     - Hum, nada demais - eles respondiam. - É a torre, ela é magica. Ela te transforma. Você amadurece.

     Eles estavam realmente diferentes. Até a voz deles estava diferente; estava morna, calorosa, ecoava com outro som e parecia música. Eles tinham uma nova presença e também tinham um novo sorriso, e alguns, antes de entrar lá, nem sorriam direito.
     Alguns ficaram com um pouco de inveja, e a inveja os fechou. Ficaram irritados, dizendo que eles eram impostores, que estavam fingindo e mentindo. Era uma pena, porque esses seres perderam a oportunidade de também se transformarem.
     Outros, ficavam interessadíssimos. Então perguntavam se podiam entrar na torre também.

     - É claro que pode - respondiam aqueles que se transformaram -, não há ninguém lá dentro para impedir. A torre é mágica. Ela cresce sozinha.

     Aos poucos, as pessoas começaram a entrar cada vez mais. Quanto mais pessoas entravam, ninguém sabia explicar o porque, mas elas demoravam menos tempo ainda para saírem transformadas. As primeiras demoraram anos; as outras, meses. Depois, quando entrou um grande grupo, demorou apenas algumas semanas.

     Com o tempo, muitas pessoas da cidade haviam sido transformadas.
     Então, essa transformação, que ocorreu particularmente dentro delas, começou a ser refletida também na cidade.
     As pinturas estavam mais belas, as músicas com um toque de vida maior e as paisagens, estavam exuberantes. A arquitetura, explodiu em beleza. A cidade também mudou então da água para o vinho.
     Mas o que havia dentro daquela torre? O que movia aquela torre? Ninguém sabia explicar. Não havia ninguém lá.


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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Esmeralda



     Esmeralda era uma linda lagartinha que trabalhava na fábrica de lã de seu avô, Berilo.
     Sempre fora uma lagartinha muito contente, animada, que adorava comemorações e sair com suas amiguinhas.
     De uns tempos para cá, no decorrer do último ano, Esmeralda começou a sentir coisas que nunca houvera sentido antes.
     Ela estava tendo sentimentos confusos, vontade de ficar distante e sozinha, mas ainda assim sentindo grande solidão. Ela começou a sentir repulsa por algumas amiguinhas, o que era muito estranho a ela, pois aquilo não tinha nada a ver com ela. 
     Ela se sentia estranha por dentro, como se houvesse alguma coisa mudando dentro dela e ela não tendo nenhum controle sobre isso. Ela agora também estranhava as outras lagartinhas, como se, de repente, todas à sua volta estivessem se tornando de certo modo, estranhos. Ela se sentia diferente das lagartinhas ao seu redor.
     Ela não conseguia compreender o que estava acontecendo, e saiu então perguntando e pedindo ajuda para as outras lagartinhas.
     Quanto mais ela pedia ajuda, mais ela ficava confusa e mais ela se sentia estranha e diferente, porque as lagartinhas nunca haviam passado por aquilo. Então, algumas delas diziam a ela que ela podia estar ficando louquinha da cuca, e que devia buscar um médico.
     Mas, no fundo, ela sabia que não estava louquinha. Ela só não sabia o que estava acontecendo direito, não sabia o porque daqueles sentimentos tão confusos. Bem no fundo mesmo, ela acreditava que deveria ter alguma razão para ela estar sentindo tudo aquilo.
     Com o agravar daquelas sensações, Esmeralda começou a sentir repulsa pelo trabalho e uma vontade de ficar distante de tudo. Ela achou que isso logo iria passar, que era momentâneo... Só que quanto mais o tempo passava, mais vontade de ficar longe de tudo ela sentia.
     Um dia ela resolveu sair para dar uma volta sozinha, porque aquela sensação de querer ficar longe de tudo estava grande demais, chegava até a corroê-la se ela não obedecesse imediatamente. Então ela saiu, cabisbaixa, tristinha e muito confusa.
     Ela se sentou em cima de uma pedra, sem saber o que fazer. Nem orar estava ajudando mais. Ela estava realmente perdida. Mergulhou então a cabeça em seu corpo e começou a chorar...
     Uma borboletinha que estava voando no céu, olhou para a lagartinha lá em baixo e ficou muito sentida. Então ela desceu, batendo suas lindas asinhas no ar, e pousou logo ao lado dela.

     - Lagartinha... - disse carinhosamente a borboleta. - O que está acontecendo?
     A lagartinha levantou a cabeça e olhou para aquela borboleta linda. Ela era algo tão lindo que, na mesma hora, o choro passou. Que lindas asas, como será que ela tinha conseguido elas?
     - Eu não sei... - respondeu Esmeralda. - Ultimamente, no último ano para ser mais exata, eu venho me sentindo muito estranha, confusa e perdida, querendo me distanciar de tudo e de todos... Não consigo compreender. Minhas amiguinhas não conseguem me ajudar, elas me dizem que nunca passaram por isso, então eu fico mesmo muito perdida.
     A borboletinha deu uma risada suave e agradável. Esmeralda não entendeu.
     - Lagartinha - disse ela -, alegre-se!
     - Ahn? - Retrucou Esmeralda.
     - Meu bebezinho, chegou sua hora...
     - Minha hora de que? - Perguntou Esmeralda, um pouco confusa.
     - Sua hora de virar uma borboletinha e ganhar lindas asinhas, como as minhas, e voar.
     - Eu vou ganhar asas também? - Perguntou Esmeralda, não entendendo muito.
     - Claro que sim, meu anjo - respondeu a borboleta. - Eu também era uma lagartinha e, quando chegou minha hora, senti tudo isso também. Então eu escutei minha intuição, me distanciei, montei meu próprio casulo, e saí dele voando!
     - Sério? - Esmeralda estava um pouco espantada, ela não fazia ideia disso.
     - Uhum - confirmou a borboleta com um sorriso. - É por isso que suas amiguinhas não conseguem te entender. A hora delas ainda não chegou, elas não passaram por isso, não podem compreender.

     Esmeralda ficou um pouco pensativa, aquilo era novidade para ela.

     - Lagartinha - disse calmamente a borboleta -, siga sua intuição que ela te levará a algum lugar seguro. Então, com ela mesmo, você montará um casulo à sua volta e ficará distante do resto do mundo por um tempo. Muita coisa acontecerá dentro de você nesse tempo, muito movimento, e talvez você sinta um pouquinho de dor... resista, você tem que esperar. 
     - Acontecerá uma metamorfose em você - continuou contando a borboleta - e, quando ela já estiver terminado, você sentirá um impulso para rachar a casca que construiu. Nessa hora você irá sair do casulo e descobrirá que já não é mais a mesma lagartinha. Você estará diferente; mais bonita, mais leve, mais graciosa... Então, você abrirá suas lindas asinhas e voará em direção ao céu.
     - Encontrará diversas lindas borboletas, como eu, que terão imenso prazer em te receber de asas abertas.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

O Buraco Negro


     Ele era um cientista, um rapaz muito inteligente.
     Durante sua faculdade, cursando o curso de física, ele era muito bem falado por todos e todos colocavam grande esperança e expectativas nele. Aquela faculdade nunca houvera tido um garoto tão inteligente em seus institutos, e a maioria do corpo docente apostava tudo que ele, de alguma forma, revolucionaria os conceitos mundiais da física moderna.
     Antes de terminar o curso, nos últimos semestres, aquele garoto começou a ficar diferente, estranho...
     Seu olhar tomou um aspecto distante e sua fala ficou confusa. Ele não dizia coisa com coisa.
     Ele falava com frequência as seguintes frases: buraco negro. Preciso abrir o buraco negro. A gravidade vai puxar todo o universo até mim. Buraco negro... Gravidade...
     Ele tinha enlouquecido. Na verdade, não parecia mais que era aquele garoto. Ele estava excessivamente estranho.
     As pessoas começaram a achar que ele estava possuído, possuído por algum demônio ou algo do tipo. Ele estava sempre com olheiras e tinha um aspecto sempre perturbado. Estava sempre agitado, andando de um lado e para o outro, como se estivesse com problemas.
     Só que o mais estranho de tudo era que suas notas ainda eram as melhores. Apesar de todo o seu aspecto, ele ainda era o destaque.
     O tempo ia passando - ele se formou - e ele parecia cada vez mais louco, mais obcecado. Não conversava mais com ninguém, as pessoas falavam com ele e ele permanecia calado, como se não estivesse presente. E, ainda por cima, quando abria a boca, era para falar do buraco negro.

     Depois que se formou, ele mergulhou a fundo na busca do buraco negro e esqueceu o mundo.
     Um dia, um dos rapazes que se formou junto com ele percebeu que não era totalmente maluquice, que havia certo sentido nas coisas que ele falava. Então, ficou curioso e foi ao rapaz perguntá-lo o que era o buraco negro.
     O rapaz respondeu:
     - Eu sou o buraco negro e estou fazendo as experiências em mim. Quando eu conseguir abrir o buraco, vou atrair o universo inteiro; porque uma grande gravidade, um grande magnetismo, vai se desprender de mim e atrair tudo. Me desculpe, não tenho tempo para conversar. Me deixe só! Estou no final de minha experiência. Já eliminei boa parte do que havia em mim, estou terminando de eliminar o resto. Estou para injetar a ultima injeção. Depois dela eu vou ficar vazio, então vou subir no alto da montanha e de lá irei atrair o primeiro raio. Depois que ele me atingir, o buraco irá se abrir por inteiro. Saia daqui! Me deixe só!

     Então o rapaz o deixou só e ele injetou a última injeção. 
     Tudo estava pronto. Ele estava vazio, sem nada. Era a hora de subir na montanha.

     Saiu de casa e se dirigiu às montanhas. Atravessou o bosque e começou a escalar.
     Chegando lá em cima, ele tirou suas roupas e se despiu. Eram as únicas coisas que lhe sobraram. Então ele olhou para o céu, esticou os braços abertos e, gritando, disse:
     - Estou preparado! Fiz tudo o que o senhor mandou fazer desde que você me encontrou! Me leve! Termine seu trabalho!

     Então, na mesma hora, um grande raio desceu e atingiu o centro do peito dele. Ele ficou negro como carvão.
     Logo depois, o vento ao seu redor começou a ser sugado e a entrar dentro dele. Ele sentia grande dor, muita dor, e gritava.
     As árvores à volta, eram sugadas por aquela intensa gravidade que vinha dele e suas raízes se desprendiam do chão. Então elas vinham puxadas pelo ar e entravam nele também. Ele sentia grande dor.
     A fundação dos prédios à volta, começaram a rachar. E então eles se desprendiam do chão e eram sugados por aquela intensa gravidade. Os prédios entravam nele e ele sentia grande dor.
     As pessoas, começaram a ser puxadas também. Elas tentavam se agarrar no chão, nos postes, em qualquer coisa; mas aquela coisa também era sugada pela gravidade e ambos entravam nele. Ele sentia muita dor.
     Pouco a pouco, o universo inteiro foi sugado e entrou nele. Foi um grande sofrimento. Mas, quando não havia mais nada, acabou a dor. 
     Ele era o universo inteiro - o universo inteiro era ele.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

O Menino Chorão


     Ele era um garoto comum, um menino de classe média da cidade. Vivera sua vida normal, como todos. Quando era garotinho, frequentou a escola, depois que se tornou jovem, cursou a faculdade e então houve um período, durante seu curso, que ele passou a sentir coisas estranhas.
     Ele sentia solidão, angustia e dor. Muita dor. Se afastou dos amigos, da família e mesmo do curso. Passou muito tempo sozinho, tentando compreender o que acontecia consigo.
     Depois de um tempo, depois de ter finalmente compreendido, ele parou de sentir solidão, de sentir angústia e de sentir dor. Mas aconteceu algo novo, ele começou a chorar.
     Ele ia para a faculdade, e chorava. Ele ia para sua casa, encontrava com sua família, e chorava. Ele saía na rua, sentava num banco de praça, observava as pessoas, e chorava. Ele saía com os amigos, e chorava. Ele ia para festas da cidade, e chorava. Visitava a igreja, e chorava. Ia ao médico fazer exames, e chorava. Ia ao dentista, e chorava. Ia em centros de meditação, e chorava... Todo lugar que ele encontrava com alguém, ele chorava.
     Isso era muito incomum e começou a chamar a atenção das pessoas ao seu redor. Elas não conseguiam entender e não encontravam nenhuma razão para um garoto chorar tanto. Elas imaginavam que talvez alguém querido houvesse morrido, ou que ele estivesse passando por algum momento muito difícil... Mas tinham vergonha de perguntar a ele.
     Com o tempo, ele continuava chorando, então a curiosidade das pessoas ficou maior que a vergonha, e algumas iam até ele perguntar o porque. Com boas intenções, queriam consolá-lo.
     Então as pessoas vinham e perguntavam:

     - Garoto, porque você está chorando? Não chore, para tudo há uma solução. Não é o fim, acredite em mim...
     - Não é nada disso - dizia o garoto. - Eu não estou sofrendo, estou em imensa paz. Não é sofrimento que me faz chorar, são vocês. É olhar para vocês e não saber o que fazer.
     As pessoas ficavam numa confusão absurda quando ele dizia isso. Não entendo bulhufas.
     - O que você quer dizer? - Diziam elas. - Estou te incomodando? Quer que eu saia?
     - Não, não é isso - dizia o garoto. - Vou tentar te explicar. Depois de eu sofrer minhas dores, descobri a paz. Uma paz infinita e duradoura. Então, eu mudei, mas o mundo ao meu redor não mudou. O mundo está igual como era antes.
     - Então - continuou ele -, depois que eu compreendi a origem dessa paz, eu sei que todo mundo pode tê-la e que é de graça. É até um direito de cada um obtê-la. E, além disso, não é preciso de nada nem de ninguém, só da pessoa mesmo. Então é totalmente gratuito e acessível.
     - É por isso que eu choro - contou ele. - Eu saiu na rua e vejo as pessoas sofrendo, sofrendo e buscando a solução. Buscando a solução ali, aculá, naquele lugar, com aquela pessoa... E eu sei que é tudo em vão. Perda de tempo, jamais encontrarão. Estão procurando a luz no escuro, e a luz está logo ao lado deles, logo ao ladinho mesmo, está praticamente tocando neles... é só mudar a direção e puft
     - Então sinto uma tristeza profunda, porque eu estou vendo tudo isso e não posso fazer nada. Me sinto impotente. Vejo o sofrimento e também vejo a saída dele, mas eu não posso mostrar. Eu posso falar, apontar a direção, mas não posso mostrar... E quando falo, é algo tão simples, que é difícil de acreditar. É preciso que a pessoa vá e confira por si mesmo. E como é algo tão simples, como a solução do sofrimento é algo tão simples... Ninguém opta pelo simples. Não pode ser isso, é muito simples para ser, elas pensam. Porque o sofrimento parece ser complicado, então as pessoas imaginam que a solução também deva ser complicada; que é preciso grande esforço, grande luta, grande empenho para conquistá-la... Então, o caminho que mostra grande luta, parece ser verdadeiro.
     - Mas não é - contou ele -, é um beco sem saída. Todos que estão nele ainda não encontraram a paz, estão buscando. E eu sei porque eu encontrei a paz. 
     - Por isso eu choro, choro em todo lugar que vou. Todo mundo está sofrendo e eu tenho a solução. Mas não posso mostrar porque vocês não podem ver, não podem acreditar. Então eu choro por não saber o que fazer. É como se dependesse apenas de mim acabar com o sofrimento do mundo, e eu, impotente, tento mostrar e não consigo, então eu choro. E choro muito. Sei que vou chorar até conseguir poder mostrar.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

O Medo da Solidão



     Ele era um rapaz muito popular e estava terminando de cursar a faculdade. Sempre estava rodeado de amigos e de pessoas, então raramente ficava só.
     Logo que terminou a faculdade, uma grande empresa o contratou para um trabalho em que ele viajaria o mundo inteiro. Ele era um ótimo aluno, tirava boas notas e tinha um excelente currículo. Era um destaque, e isso atraiu os olhos daquela grande empresa.
     Ele estava muito contente, sempre quis viajar o mundo; era um oportunidade única. Ele ia conhecer lugares novos, pessoas novas, novas línguas; estava adorando a ideia.
     Então ele se formou na faculdade e já saiu empregado. Assinou um contrato de dois anos com a empresa. Logo que se formou, se despediu dos amigos e família, e então viajou.
     Ele passava um mês em cada lugar diferente, conhecendo lugares maravilhosos e ficando em lindos hotéis. Ele estava muito orgulhoso, tirava muitas fotos e sempre ligava para os amigos e família contando sobre suas viagens. Ele sabia que era uma oportunidade única, que raros têm... Então ele celebrava contente.
     Ele se deliciava nos hotéis. Caminhava pelas cidades, vendo novas paisagens e comendo diferentes tipos de comida. Além disso tudo, estava ganhando uma ótima grana, e estava fazendo uma boa reserva. Era tudo que alguém poderia querer ter, e ele sabia disso.

     Depois de seis meses, começou a acontecer algo estranho... Ele sabia que deveria agradecer e que era abençoado, todo mundo lhe dizia isso. Mas ele não estava se sentindo grato, pelo contrário, estava se sentindo só, vazio.
     Sempre que entrava em seu quarto de hotel, uma sombra descia repentinamente sobre ele e ele se assustava. Sentia medo. Então ele saía do hotel e corria para longe daquela sombra. Procurava alguma coisa para fazer, algum lugar para visitar, alguém para conhecer... Qualquer coisa que o fizesse desviar da sombra.
     Mas aquela sombra não o deixava quieto. Andava com ele para onde quer que ele fosse, como um parasita. Ao mero sinal da sombra, do vazio, ele corria. Escapava da sombra como um boi escaparia do matadouro.
     Se não houvesse o que fazer, ele corria para o telefone, ligava para alguém, ou, caso não houvesse a quem ligar, ele corria para as redes sociais.

     Mas a sombra foi se tornando cada vez mais audível e menos invisível; era cada vez mais difícil escapar dela.
     Quando ele voltava para sua casa, depois de longas viagens, ele se sentia um pouco melhor. Estar com a sua família parecia que afastava a sombra. Mas ele sabia que ela estava lá, sabia que mais cedo ou mais tarde ela iria dar as caras.
     Então vinha a hora de uma nova sequência de viagens e ele se apavorava. Tinha certeza absoluta que a sombra o iria fazer companhia. Mas ele tinha que ir...

     Então ele viajou novamente, e viajou novamente, e novamente. A sombra sempre vinha e ele sempre corria. Numa dessas fugas, ele pensou que comprar um livro poderia ser uma boa saída. Então ele foi à livraria.

     Percorrendo as prateleiras... Ficção... Religião... Historinhas infantis - ele se deu um pouco de tempo nessa seção, adorava crianças -... Geografia... História... Auto-ajuda - ele parou aqui. Algo despertou sua atenção.
     Havia um livro roxo, com letras brilhantes no título, que estava intitulado: "Encare a solidão, encontre a paz sem razão".

     Paz? Solidão? Aquilo tinha muito a ver com ele, sua solidão não o estava deixando ter paz, ele precisava estar sempre escapando dela.
     Ele comprou o livro e foi para o hotel, sentindo uma ligeira curiosidade, então foi com pressa. "Paz sem razão?", "Paz?"; era tudo o que ele precisava. Ele vivia sempre na hora do rush, tendo que fugir de si mesmo para não entrar em conflito existencial e desabar. Aquele livro parecia ter alguma resposta.
     Chegou então em casa e começou a devorar o livro. O livro dizia assim:

     "Fomos ensinados a escapar da solidão, como se ela fosse um monstro apavorante. Ela parece mesmo um monstro apavorante, pois nos conhecemos, e quando a solidão bate à porta, tudo aquilo que sabemos sobre nós mesmos parece não ter importância e valor nenhum. Isso gera muito medo, um grande medo.
     Mas isto é só uma falta de compreensão, pois, na solidão, existe uma qualidade de infinitude que transforma a pessoa em algo muito maior do que aquilo que ela já é. O medo não é sem razão, o medo vem da essência pessoal que reconhece, intuitivamente, que irá desaparecer se a solidão invadir. Não tenha medo, a solidão precisa invadir e te possuir. Permita que ela seja, que entre em você. 
     A solidão carrega uma qualidade divina, a mesma qualidade que você pode ter uma diminuta amostra quando olha para o céu estrelado. Ou quando chega em cima de uma montanha e avista o horizonte. Ou quando navega no mar e observa aquela imensidão... São pequenas amostras. A solidão carrega a essência dessa amostragem, que é infinitamente maior e mais abrangente do que ela.
     O medo que vem com a solidão, não é um medo qualquer. É um medo de morte. Porque a solidão, ao primeiro ver, aparenta ser uma morte. E é, de fato. A solidão é um chamado, um chamado de morte. Mas isso não é ruim. Isso é magnífico. A solidão faz você morrer para o que você era e renascer para algo infinitamente maior. Eu uso a palavra infinito, mas ainda é uma palavra pequena. Porque não há como expressar aquilo que a solidão trás. Você descobre uma paz que excede toda a compreensão possível de ser colocada em palavras.
     Isso só acontece quando você mergulha intensamente na solidão. Então, amigo, será você quem estará escrevendo este livro, pois entenderá algo tão inominavelmente grande, que compreenderá quase tudo o que acontece no planeta terra. Compreenderá todo o sofrimento, toda a tristeza, toda a angustia e toda dor. Saberá porque elas ocorrem, e ocorrem porque as pessoas estão correndo da infinitude imensamente alimentadora e preenchedora que a solidão em si carrega. Estão correndo do infinito.
     Então você estará escrevendo este livro para resgatar sua mãe, seu tio, seu irmão, seu primo, o mendigo, o desconhecido, o amigo e o inimigo. Estão todos sofrendo com o universo nas mãos. São pobres a um passo da riqueza. Sentem fome com comida na mesa."


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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A Prisão de Cristo


     Ele estava preso. Os amantes da terra e da mãe natureza estavam desesperados. Era o fim. Aquele que podia os salvar ia ser condenado à morte.
     Sem piedade, e com um largo sorriso de satisfação, os defensores da cidade tinham cristo nas mãos.
     Eles celebravam! Era o fim do tumulto, fim dos abalos, a cidade estava à salva. O homem que estava abalando as estruturas pré-moldadas estava finalmente preso. Na cela, e depois na morte, ele estaria calado, fora silenciado. Não haveria mais como ele influenciar ninguém.
     Os donos da cidade iam até a cela dele, rir dele e dizer:
     - E agora, salvador? - Diziam eles, desdenhosos e cuspindo no chão. - Onde está seu Deus agora? Cadê o todo poderoso agora que você está preso? Porque não manda ele destruir as grades e salvar o salvador?

     Todos riram. O rapaz permanecia calado.

     - Agora que você vai morrer - disse um deles -, eu quero ver... Toda a terra vai olhar para o filho de Deus e dizer: "pobre mentiroso..."
     - Vocês não compreendem - disse o rapaz. - Vocês tentam se esconder mas não podem. Vocês estão fazendo exatamente a vontade do Pai.
     - O que você quer dizer? - Perguntou um deles. - O Pai quer seu filho morto?

     Eles deram outra rajada de gargalhadas.

     - Exatamente - confirmou o rapaz.

     Os defensores da cidade ficaram confusos.

     - Estou aqui porque meu pai quer assim - disse o rapaz. - Se não fosse a vontade dele, eu não estaria aqui e nem vocês estariam vivos. Foi meu Pai que os deu vida e que os mandou me prender.

     - Deixe de asneira - vociferou um deles. - Você está aqui porque nós te prendemos.
     - Vocês podem prender este corpo, e podem até tocá-lo, mas a voz que vos fala não está neste corpo, este corpo é só sua morada.

     Os defensores da cidade não entenderam.

     - Além de estar aqui - disse o rapaz -, estou em todo lugar. Remova uma pedra do chão e lá estarei eu. Vocês querem me impedir, mas vocês irão me revelar.
     - Este corpo precisa morrer - continuou ele -, pois assim o mundo irá me conhecer. Vocês podem perfurar o corpo, podem tirar o sangue, podem até comer a carne... Mas vocês não podem impedir aquele que escreve o romance.
     - Cale-se! - disse um deles, raivoso e cuspindo em cristo. - Você vai morrer!

     Cristo riu. Era engraçado, mas ele riu de verdade. Um sorriso inocente, como se estivesse mesmo ouvindo algo engraçado.

     - Vocês podem matar o filho, mas não podem tocar no Pai - disse cristo. - Eu voltarei em breve. Depois que este corpo morrer, o mundo inteiro vai saber da existência de cristo, da existência da verdade; então eu poderei ressurgir neles. Então, quando eu voltar, não vai ser só esta centena de pessoas que irão me ver. O mundo inteiro saberá que eu sou.

     Os defensores da cidade sentiram uma espécia de temor. Apesar de parecer estar completamente louco, a voz daquele homem tinha um certo poder, uma força estranha. O coração deles, mesmo sem querer, acreditava no que ele dizia.

     - Alegrem-se, meus filhos - disse cristo. - Por causa de vocês, e somente de vocês, o mundo inteiro verá cristo. Vocês não me matarão, vocês me revelarão.


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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O Pescador de Almas




     A ele foi dado o conhecimento de ir além. De ver através das paredes, de ouvir por detrás das palavras, de sentir o invisível e de conhecer o não conhecido. Ele precisava deste poder, precisava para ver as vítimas com destreza, porque ele era o pescador de almas.

     Ele ia caminhar pela noite e invadir cada casa, cada prédio, cada construção onde houvesse uma multidão, e roubar o filho unigênito. Pois essa era a sua missão, ele era o pescador de almas.
     Com o filho unigênito em mãos, as pessoas se entregariam facilmente a ele, e ele ganharia muitas almas. Seu pai ficaria orgulhoso; há milênios que ele viera preparando o seu filho para a última guerra, para a última batalha. A batalha em que seu filho, o espírito guerreiro, iria finalmente derrubar as muralhas e dissolver as almas separadas que nunca houveram se entregado.
     Seu pai estava velho e não podia mais lutar, então era seu filho quem iria realizar esse papel. Ele sabia que seria uma longa jornada, mas o pai treinou seu filho muito bem. Ele sabia que seu filho poderia dar conta do recado.
     Apenas para ter certeza de que tudo daria certo, seu pai o revestiu com a armadura de ouro, que caminha sobre as águas da dor e da solidão, e lhe deu o cetro de luz, que revela o caminho e ilumina a escuridão.

     Depois de anos de batalha, eles teriam finalmente conquistado um número suficiente de almas. Então o pai iria fundi-las todas em uma só, ganhando assim uma super-alma, com grande poder, para a sua última investida: invadir o castelo do cofre e destruí-lo definitivamente.


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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Palavra da Salvação



Aqueles que deram adeus ao eu
Herdam do espírito uma grande herança
É a Palavra da Salvação.
Palavra que tem poder na multidão,
Que atravessa a carne,
Que ressoa no coração.

A palavra tem diversos efeitos,
A depender de cada situação.
Vinda do espírito
Veio do criador do umbigo
Então tem poder de ser ouvido

Aos que resistem:
A palavra é espada.
A Espada da Verdade
Que corta a pessoa pela metade

Aos que se entregam:
A palavra é salvação.
É ouvida como canção
Luz que tira da escuridão
E que transforma o coração

Aos que não escutam:
A palavra é terror.
O terror da terra dos homens
Porque balança a terra deles
Desfazendo pelo interior
Carregando filho, neto e amigo
E deixando-o sozinho

Não há como escapar
Pois do mesmo jeito que não se foge do vento
Você pode até se esconder
Só que mais cedo ou mais tarde o vento toca em você.


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

A Bruxinha sem Cabeça



     Um feiticeiro chamado Adiv estava chateado com a bruxinha, porque eles eram casados, viviam juntos e, depois de um tempo, ela se esquecera dele e não olhava mais para ele. Isso deixava ambos infelizes.
     Então ele passou a se sentir mal na presença da bruxinha, porque ela olhava para todos os lados, menos para ele. Ele desejava que ela olhasse para ele de novo.
     Então abriu seu livro de feitiços e começou a pesquisar, acompanhando o índice de feitiços com o dedo, até encontrar o feitiço que a fizesse olhar para ele de novo. Pesquisou, pesquisou, mas nada encontrou.
     Então vagou novamente o dedo pelo índice e parou em um: "Cortando a Cabeça Fora".
     Ele pensou: se a bruxinha não pode olhar para mim, então não irá olhar para mais ninguém.
     Então leu o feitiço e memorizou as palavras.
     Quando a bruxinha chegou em casa, ele estava na sala, e ela a atravessou como se ele nem estivesse presente. Então ele se dirigiu a ela e disse:
     - "Pelas vacas do cabresto, você não enxerga por isso não vejo. Pelo nome que criou, eu lhe ordeno, seu pescoço decepou."
     E na mesma hora a cabeça dela desapareceu. Virou uma bruxa sem cabeça.
     Ela não podia ouvir e não podia ver. Sem sua cabeça, estava perdida.
     Passou a andar de lá para cá, tentando resgatar sua cabeça. Ela não a encontrava em lugar nenhum. Tocava tudo à procura, mas não encontrava.
     Ficou muito triste e angustiada, mas não podia chorar porque não tinha cabeça, então o choro ficava preso no peito e isso a corroía. Mas ela era determinada, não ia descansar até encontrar sua cabeça de novo.
     Percorreu longos dias à procura de sua cabeça e, num desses dias, ela tocou em algo parecido. Percorreu a mão e sentiu alegria. Era a sua cabeça! Ela reconheceu, tinha certeza.
     Eufórica, pegou ela e a encaixou de volta no pescoço.
     Foi então que teve uma surpresa desagradável, a cabeça não estava encaixando. Depois de tanto tempo sem sua cabeça, sua cabeça não encaixava mais em seu pescoço.
     Ela ficou muito triste e se sentou no chão... decepcionada. Decepcionada com a sua cabeça, com o feiticeiro mal, com sua vida; com tudo.
     Foi então que ela desistiu. Olhou para o céu e disse bem alto: me leve embora! Eu não quero mais viver.
     Foi então que sua cabeça nasceu. Do pescoço ela surgiu e nasceu. Estava diferente, nasceu uma nova cabeça.
     Ela voltou para casa, olhou para o feiticeiro e o enxergou. O feiticeiro ficou muito contente, ela também... ela se lembrou de como era feliz estar na presença dele. Estar vivendo com ele.


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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A Porta do Reino



Depois do sofrimento e dor,
A porta se abre, então vem o reino, invade.

Da porta aberta surge uma voz,
A voz aponta o caminho,
Prepara os ovos para o nascimento.

De uma porta nascem cem,
De duas portas nascem mil.
Mas com apenas uma aberta,
O sofrimento reduziu.

Agora não é preciso força para rachar a casca
Agora que uma porta foi aberta
Um caminho se abriu
Quem escuta, comemora
Está a salvo do que apavora

Para um que sofre,
Cem regozijam.
Para dois,
Regozijam mil.

Da porta aberta vem o batedor
Que sai batendo de door em door
Agora não é preciso sofrimento para abrir a porta
Com o servo do rei batendo,
Ele já bate no lugar certo

Você não precisa procurar a porta certa
Basta apenas você abrir
Você não precisa se esforçar
Basta apenas você ouvir

O som vem do caminho,
Uma voz que conduz ao ninho

Quando uma flor nasce
Felizes daqueles que a podem ver
Porque o perfume dela as invade
Faz morada no seu ser

Acabou o sofrimento, acabou a dor
Aquele que sofreu sozinho
Lhe trouxe a porta,
Lhe salvou,
Lhe trouxe o amor.


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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domingo, 26 de janeiro de 2014

A diferença de buda e do senhor




   O senhor era um rapaz de meia idade que adorava buda.
     O Rapaz tinha tudo. Ele era rico e tinha uma grande família. Uma esposa e sete filhos. Todos bem casados e, como era muito rico, todos tinham sua própria casa, nos campos do palácio dele.

     Mas ele sentia algo estranho... Nas horas vagas ele sempre pensava em buda.

     Havia algo diferente na presença de buda e o rapaz não conseguia entender perfeitamente o que era. 
     Ele sabia que buda era iluminado, porque buda o contou, mas isso não o interessava. Buda o fazia sentir-se contente, era disso que ele gostava.
     Ele não conseguia se sentir assim com a família dele e nem com o trabalho e, desde que conheceu buda, passou a se sentir assim. Sentir uma esperança de vida, quase uma alegria.

     Ele convidava buda sempre que podia e o chamava para dar uma volta em suas horas vagas. Era como se buda fosse um alimento para aquela alegria dele. Então ele pegava sua carruagem e ia até a cabana de buda buscá-lo.

     Um dia, em uma dessas voltas, buda deixou escapar que estar alegre com o rapaz, não era diferente para buda. Buda sempre estava contente.
     Ele ficou triste, ele estava pensando que encontrar-se com ele era tão especial para buda quanto ele sentia que estar com buda era para ele.
     Buda falou para ele não se preocupar com isso, porque ele só se sentia buda quando estava com ele, mas que buda estava sempre se sentindo contente. Não importando aonde fosse, porque em todo lugar que buda ia, ele encontrava com buda.
     Ele não entendeu bem o que buda queria dizer e então fez uma cara estranha. Então buda contou a ele:

     - Quando senhor está com buda, senhor encontra consigo e senhor se sente contente. Senhor pode ser senhor porque senhor se encontrou. Isso trás muita alegria para senhor. 
     - Vejo buda, então posso ser quem buda é, porque senhor é quem buda é. Então isso trás alegria para buda. Buda pode ser buda.
     - Esse é único segredo de buda, porque é tão bom estar com buda. Senhor se encontra.
     - Senhor vai para trabalho, vai para casa, e não consegue encontrar senhor em nenhum lugar.
     - Então com buda, senhor se encontra. Então senhor sente prazer diferente, prazer novo. Senhor está vivo.
     - Mas há grande diferença entre buda e senhor... buda decidiu andar sempre com buda, então buda se busca.
     - Senhor encontra com buda, mas não busca encontrar com senhor, então senhor só se encontra quando está com buda. Porque quando senhor não está com buda, senhor não está se procurando. Então senhor só se vê aqui, na presença de buda.
     - Se senhor buscasse senhor, como se encontra com buda, depois de ver buda, senhor seria buda; e veria buda à volta.
     - Buda só anda com buda. Buda pode ver buda na árvore, no rio, no céu, nos pássaros, nas pessoas e no vazio. Porque quando senhor se busca, senhor se encontra. E se encontra em todo lugar.
     - Tudo é buda. É assim que buda vê.


~ * Palavras que saíram da  Boca * ~
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