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domingo, 2 de junho de 2013

A Cavada de Arthur

     A Cavada de Arthur



     Arthur tinha acordado de repente numa ilha, uma ilha minúscula. As únicas coisas que ele tinha próximo de si eram um pedaço de areia circular, com raio de 4 metros, uma árvore que dava frutos, e uma garrafa preta opaca. 
     Ele não fazia a mínima ideia de como havia acordado ali. Antes de dormir ele estava em casa, em sua cama, e agora estava ali; só ele e o mar. O mar infinito.
     Olhando para todos os seus lados, ele não enxergava um pedaço de terra sequer. Só o mar e o esplendor do azul do céu no horizonte.
     Ele ficou preocupado. Onde estavam as pessoas? Como ele foi parar ali? O que ele iria fazer ali sozinho? Porque ele estava ali? Seria alguma pegadinha? Alguma brincadeira? Quanto mais ele raciocinava, mais questionamentos surgiam em sua mente.
     Ele olhou para a garrafa preta e a pegou. Examinou-a, e se perguntou o que aquilo estava fazendo ali.
     Ele a virou de cabeça para baixo e balançou-a no ar para ver o que saia de dentro. Um bilhete velho caiu exatamente sobre seu colo
     Ele abriu o bilhete e leu: - Te transformei em um rei. Você agora é herdeiro de um grande reino e todos lá te amam. Mas o que você fará preso em uma ilha sozinho? Assinado: As estrelas do céu.
     Ele era um rei? Tinha um reino só dele? As pessoas o amavam? - Pensou. - Ele ficou muito contente, uma euforia surgiu sobre si. Ele começou a imaginar um milhão de coisas que poderiam ser feitas com um reino só dele. A ideia parecia muito divertida. Mas então ele se recordou: 
"- Oh não! - Colocou as mãos sobre a cabeça. - Estou no meio do mar!". Ou pelo menos era o que lhe parecia.
     Meditando um pouco, logo lhe veio um insight. Ora bolas, ele era um rei! Logo, logo, um barco do reino viria lhe buscar, afinal de contas, de que vale um reino sem seu rei? Um rei é a pessoa mais importante, logo eles viriam - pensou. Então ele se sentou próximo a árvore, colheu uns três frutos, e aguardou enquanto os comia e se alimentava.

     O tempo foi passando, e passaram-se minutos, horas, e começou a anoitecer. Ele começou a ficar com medo. Logo, logo, a terra escureceria sobre si, e ele estava ali, sozinho; talvez a milhares de quilômetros de distancia de outro ser humano.
     Estar distante de todos era assustador, ainda mais quando se observava o ambiente lentamente ficando cada vez mais escuro.
     Então o dia escureceu por completo. Lá estava ele, totalmente no escuro; sem ninguém, e sem nem poder enxergar as suas próprias mãos.
     Ele começou a sentir medo, muito medo, e o medo começava a aumentar cada vez mais naquela noite escura que parecia não ter fim. Se aquilo não era o inferno, ele não saberia dizer outra coisa que se pareceria com ele. O medo se tornou pânico, um pânico tão silencioso e obscuro, que o fez começar a tremer de medo e de frio. As horas não pareciam horas, pareciam dias, e cada minuto parecia uma eternidade.
     Ele olhava para os céus em busca de uma luz, mas não havia nem estrelas e nem lua. Somente aquela escuridão sem fim; para cima, para baixo, e para os lados.
     Ele fechou os olhos, cruzou os braços sobre si mesmo, e postou-se a orar e a pedir ajuda a Deus para sair dali. Aquela oração era tão sincera e verdadeira, que ocorreu espontaneamente. Aquilo era um grito de socorro do fundo de sua alma. E vinha de uma região tão profunda adentro dele, que não era uma simples oração, era uma energia que percorria todo o seu corpo - de cima a baixo -, uma oração realizada pelo corpo inteiro.

      Então ele ouviu um barulho - Pshhhhhuu... - contínuo, que parecia vir de distante. Ele abriu os olhos e lá de longe no céu avistou uma luz que vinha brilhando suavemente pelo céu. Ela emitia uma luz um pouquinho mais forte que a de uma estrela, uma luz amarelada, e veio se aproximando até que parou em cima de Arthur, a anos luz de distância. Logo quando estacionou sobre ele, ele escutou alguns pensamentos que surgiram em si: "Estarei aqui de longe até essa noite escura passar".
     Arthur ficou olhando para aquela estrelinha amarela, só existia ela no céu. Era uma visão  muito bonita, apenas aquela luz lá distante, infinitamente distante, mas daquele ponto de vista, parecia que estava muito perto, a alguns braços de distância, quase que dava para ele a agarrar.
     Arthur ainda estava com muito medo, pois ele ainda permanecia ali sozinho naquela escuridão. Mas mesmo com a presença do medo, que ainda era forte, ele já se sentia um pouquinho mais seguro. Em algum lugar lá no fundo de si, ele sentiu um calor, uma minúscula chama se acendeu, uma chama de confiança. Então seus olhos começaram a se fechar lentamente no conforto de seu próprio medo, e ele descansou ali mesmo, na escuridão dele.


     Ele acordou logo depois que o sol havia nascido por completo, aquele clarão batendo nos seus olhos o despertou de vez. Ele coçou os olhos, olhou a sua volta, e tinha uma pá encravada na areia, logo ao seu lado. Nela tinha amarrada uma fitinha vermelha cheia de estrelas, e havia escrito por todo o contorno da fita:

     "Arthur, eu posso te ajudar, mas você vai ter que cavar, porque eu me encontro na base da ilha que você está pisando. Eu não posso chegar até você, eu só posso te mostrar a luz para você seguir. É você quem tem que chegar até mim, porque além deu estar aqui, eu estou em todo lugar".

   Então Arthur na mesma hora pegou a pá decidido, e começou a cavar. No início, ele cavava muito depressa e estava se cansando rapidamente. Então ele foi no jogo do erro e do acerto, começando a diminuir a intensidade até encontrar a frequência ideal. Aquela que ele pudesse manter uma cava constante, com o mínimo gasto de energia.
     Ele já estava cavando por um longo tempo, e prosseguiu assim ao longo de dias, meses, e anos; cavando sem parar. As vezes ele descansava um pouquinho, e logo retornava. Estava sempre cavando. Chegou um momento que ele nem sabia mais o que estava fazendo, mas ele continuava a cavar, como se tivesse entrado no piloto automático, logo após ter decolado. Algo estava puxando ele cada vez mais depressa e mais pro fundo, até que se tornou uma ação espontânea. Não havia mais esforço. A partir de um momento a cava se tornou natural, parte de seu ser.
     Então um dia ele bateu a pá em rocha dura. - Creck! Soou o barulho da pá ao bater em solo firme.
     Ele limpou o restante de areia que estava cobrindo a base, para verificar melhor o que havia ali. Ele encontrou uma alavanca, e em cima dela tinha uma placa de metal e umas letrinhas que brilhavam: 
"Entregue-me os teus desejos e eu te entregarei os meus. Meus desejos serão os seus, então terás sempre tudo o que desejar. Serás um rei, o rei dos desejos luz".

     Então Arthur refletiu por uns instantes, mas não havia muito o que refletir, os desejos divinos foram o que ele sempre almejara durante toda a sua vida. Então ele puxou a alavanca dizendo: 
"Está entregue todo o meu mundo, tudo o que sou, tudo o que sei, tudo o que um dia serei". E logo após Arthur ter movido a alavanca, ele desapareceu de seu corpo. Mergulhando num vácuo infinito. Ele perdeu a consciência.


     Arthur acordou no dia anterior, como se não tivesse vivido aquela dia. Então ele se levantou curioso, ele não tinha dúvidas de que aquele dia tinha existido. Ele se sentia diferente, alguma coisa havia acontecido. Então ele se dirigiu à janela de seu quarto, a abriu, e quando a luz do dia refletiu sobre seus olhos, ele não conseguia acreditar no que ele estava vendo e no que ele estava sentindo. Ele estava em outro mundo, um mundo tão mais rico em infinitos sentidos, que ele não sabia nem como explicar. E o mais interessante, ele estava no mesmo lugar de antes!
     


~* Palavras que saem da Boca