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terça-feira, 25 de março de 2014

A Sementinha que Esmorece




     Ele era um garoto um pouco perturbado, inquieto, até chato. Mas não era a vontade dele ser assim, ele simplesmente era assim, ele nem sabia o porque.
     Quando menino, ele não gostava de ir para a escola. Seus pais o forçavam a ir, dizendo que toda criança deveria ir para o colégio, e isso rendia uma grande briga dentro de casa. Então ele ia, de carra amarrada e chateado. Todo dia era assim. Ele não tinha poder de palavra contra seus pais.
     Durante as aulas, ele ficava inquieto, sacudindo as pernas. Não conseguia prestar atenção nas aulas; ficava imaginando mil e uma coisas, sonhando... Ficava desenhando no caderno, escrevendo versos... Tudo era possível, menos ouvir a voz do professor. Isso era péssimo, porque quando vinham os exames, o garoto sempre se dava mal, e isso rendia mais brigas dentro de casa. Sua auto-estima ia lá para baixo.

     Ele gostava de música, de pintura, de filmes... Mas era proibido pelos seus pais de ouvir, pintar ou assistir, há não ser que estudasse. Ele odiava estudar, simplesmente não conseguia. Ele não compreendia como existiam pessoas que se davam bem com os estudos, era algo impossível para ele; e seus pais não conseguiam entender isso, porque sempre foram muito estudiosos.
     Quando ele ia estudar, começava a ler e as palavras se embaralhavam em sua mente e ele não entendia coisa alguma. Era horrível, ele sentia-se péssimo. Sua auto-estima ia lá para baixo.
     Então ele não podia fazer o que gostava, e era obrigado a fazer o que não gostava. Isso o deixava sempre perturbado e infeliz.

     Em uma dessas noites, seus pais saíram de casa para um jantar. Então, ele, esperto, foi correndo para a televisão e a ligou.
     Enquanto estava trocando os canais à procura de um filme, passou por um canal onde estava passando um desenho animado que, por alguma razão desconhecida, despertou a atenção dele e ele parou.
     Era uma floricultora e um garotinho, cuidando de uma sementinha. A semente tinha olhos e boca, e a floricultora estava contando para o garoto:

     - A semente quer crescer, para dar frutos e flores. Ela ficará muito feliz em dar frutos e flores, e assim presentear toda a fauna e a flora. Da até para sentir a alegria da planta quando está acontecendo...
     - Ela nasceu para isso - continuou a floricultora -, é isso que a trará alegrias. Nós temos que cuidar dela, dar o que ela precisa: regar, colocar ela debaixo da terra, e ficar atento para que nada estrague ela. Se nós não dermos as condições da semente crescer, se não a deixarmos em um local onde ela possa crescer - neste caso, debaixo de terra nutritiva -, olha o que acontece...

     Então a floricultora pegou a semente, com cuidado, que estava sobre a terra, e a colocou em cima da mesa, num lugar onde ela não poderia germinar. A semente, que tinha olhos e boca; estava feliz, alegre, sorridente e radiante. Quando ela foi colocada em cima da mesa, aos poucos, o seu sorriso foi esmorecendo... Depois que ela já estava um bom tempo de carinha triste, ela começou a se debater para os lados, inquieta...

     - A semente nasceu para ser uma linda árvore - contou a floricultora para o garoto. - É uma super oportunidade para ela. É muita alegria, e ela intuitivamente sabe disso. Quando a deixamos num ambiente onde ela percebe, intuitivamente - e isso não é muito claro -, que ela não irá crescer a linda árvore que ela veio para ser; ela começa a ficar agitada e inquieta, porque seu mais íntimo coração sabe que ela pode estar perdendo sua grande oportunidade de viver, estando ali...

     O menino apertou o botão de desligar a TV, na mesma hora. Aquilo foi estranho, ele sentiu medo. Aquele desenho parecia que estava falando com ele...
     Saiu correndo e acendeu a luz, sentindo uma boa dose de medo corroendo seu estômago. Pensou em ligar para seus pais, mas o que ele iria contar? Que estava assistindo TV e um programa falou com ele? Além de se entregar, porque não podia ter ligado a TV, aquilo parecia ser bastante idiota de se contar.
     Então ele resolveu ficar ali mesmo, sentado no sofá, repetindo para si mesmo: "vai passar... Vai passar..."


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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