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domingo, 30 de março de 2014

Um buda?



     Numa manhã de sábado, um rapaz apareceu naquela cidade e sentou-se em baixo de uma árvore alta. Logo que sentou, fechou os olhos, cruzou as pernas, colocou as mãos unidas sobre o colo, e fechou os olhos; imóvel.
     Aquele rapaz, jovem, permaneceu uma semana ali, sentado, no mesmo lugar. Com os olhos fechados, do mesmo jeito. Imóvel todo o tempo.
     Aquilo começou a chamar a atenção das pessoas da cidade, que passavam por aquela árvore se questionando: "ele está meditando?"; "é um buda!"; "o que ele está fazendo ali?"

     Depois daquela semana, o rapaz continuou ali. Na semana seguinte, algumas pessoas, mesmo sem entenderem, caridosas por natureza, trouxeram água e algumas frutas e colocaram próximas ao garoto. Quem sabe ele precisasse de comida?
     Mas o garoto permanecia imóvel, como se não estivesse percebendo nada do que estava se passando ao redor.

     Passaram-se uma semana, duas... Três, quatro... Já houveram se passado quarenta dias e o jovem, agora mais magro, continuava imóvel. Do mesmo jeito, de olhos fechados.
     Aquilo começou a atrair a atenção de pessoas de cidades vizinhas, que viajavam para aquela cidade em grupos, se aproximavam do garoto, faziam uma reverência - mesmo com ele não olhando - e declaravam: - "Bem vindo de volta, óh grande Buda!"

     Um menino da cidade, bastante curioso e sem entender muito, foi conversar com seu pai.

     - Pai, você viu aquele rapaz que está sentado na árvore a quarenta dias seguidos? Imóvel?
     - Vi sim meu filho - respondeu o pai.
     - Estão dizendo que é a reencarnação de buda - comentou o filho.

     Seu pai deu uma gargalhada bem morna. Então disse:

     - Não pode ser, meu filho, buda não estaria meditando.
     - Como assim? - Perguntou o filho, sem entender. - Já vi várias estátuas de buda, ele está sempre sentado, meditando.
     - Ah, não, meu filho - respondeu o pai. - É apenas um engano.
     - Como assim? - Perguntou novamente o filho.
     - Buda está apenas sentado, em descanso - contou o pai. - Ele não está meditando.
     O menino fez uma cara estranha. Vendo isso, o pai prosseguiu:
     - Um buda não medita, ele não precisa.
     - Porque não? - Perguntou o filho.
     - Meu querido, a meditação é apenas um remédio - respondeu calmamente o pai. - O buda não precisa mais de remédio, o buda está curado.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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sexta-feira, 28 de março de 2014

O Broto que Almejava virar Flor


     Desde que o broto se tornara um botão, ele ficava olhando para as flores já abertas, desejando também se tornar uma flor. Mas ele não sabia o que fazer. Ele estava ali, fechado, e não sabia com que força, e nem como, poderia abrir sua pétalas. Mesmo assim, ele continuava observando e desejando.

     As flores já abertas atraíam abelhas, que volta e meia vinham, paravam, davam atenção à flor e iam embora, ficando ambas satisfeitas.

     As flores soltavam um perfume maravilhoso, que atraía atenção dos animais, e até dos pássaros. Mesmo os seres humanos se aproximavam das flores, contemplando-as, fazendo carinho, e aproximando suas narinas para cheirá-las. Aquele botão observava atento; as flores ficavam muito felizes com cada atenção recebida.

     O botão também desejava aquilo. Como estava fechado, não atraía atenção de ninguém. Ninguém chegava perto, ninguém olhava para ele, era horrível. Ele passava uma tormenta em observar as flores cheias de vida, companhia e alegria; enquanto ele ficava ali, sozinho, se sentindo abandonado.

     Com o tempo, o seu desejo de virar a flor foi ficando mais forte. Cada vez mais forte, e mais forte, a ponto de começar a deixá-lo agitado e impaciente. Ele precisava viver, ele queria muito viver. Já não conseguia se conter.
     Então, dentro dele, veio um impulso, muito forte: "eu vou me abrir. Esperei, esperei e nada aconteceu. Eu vou fazer isso eu mesmo, com toda a minha vontade".

     Então o botão começou a tentar se abrir. Não sabia como, com que força, mas começou a tentar assim mesmo. Tentou esticar a primeira pétala, mas não conseguia, era inútil.
     Ele continuava observando as outras flores e isso crescia ainda mais seu desejo. Ele não ia desistir, ia se tornar uma flor a qualquer custo.

     Enquanto tentava, uma abelha, acidentalmente, pousou em cima do botão fechado. Ele sentiu as patas da abelha tocando suas pétalas pelo lado externo, e teve uma sensação estranha. Ele sentiu como seria a sensação de ter a abelha tocando seu interior, tipo uma intuição. Era algo magnífico. Ele teve uma pequena amostra.
     Isso fez surgiu no botão uma força estranha, automática. A primeira pétala começou então a se abrir.

     Quando isso foi acontecendo, o sol, que estava coberto pelas folhas da árvore, atravessou por um feixe e tocou o lado interno de sua primeira pétala. Nossa, foi de outro mundo. Foi uma sensação tão gostosa, como ele nunca houvera sentido.

     Então, inesperadamente, sem nenhum esforço, suas pétalas começaram a abrir, todas elas. Ele não estava fazendo nada, ela estava abrindo sozinha... Era um milagre.

     Quando ela tinha se aberto por inteiro, o sol entrou de vez, preenchendo de calor todo o seu interior que por muito tempo houvera ficado escondido. Ele nunca tinha se sentido tão bem na vida. 
     Foi aí que uma abelha veio, e a polinizou pela primeira vez. Meu deus, ele sentiu! Era uma flor. Estava vivendo como uma flor. Se sentia realizado.

     Então ele, agora flor, viu um ser humano chegando perto. Haviam muitas flores à volta, podia ser qualquer uma. O ser humano veio chegando perto, cada vez mais perto. Sim, era ela, a escolhida! O ser humano estava vindo em direção a ela.

     O ser humano se aproximou, tocou suas pétalas com carinho algumas vezes, depois aproximou o rosto e deu uma longa cheirada na flor. A flor se sentiu no céu. Não havia explicação para aquela sensação.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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O Movimento da Vida


     Quanto mais mutável, mais real. Nada na natureza é fixo. A natureza é um movimento constante, um mutante.
     Às vezes você está amoroso, outras vezes nervoso, depois sente alegria, depois vem uma brisa triste - o humor varia. Quando você tenta transformar o movimento em algo fixo, fica louco, perdido, porque não é possível, é contra as leis da vida.
     Você quer estar sempre alegre, então fica doido. O movimento vai continuar e você vai ficar tentando se agarrar a algo que já não está mais presente.

     Por exemplo: você está alegre. Passa um tempo e a energia que estava alegre vai ficando um pouco triste, sensível, mais delicada... Mas você aprendeu que o bonito é ser alegre, que você deve estar sempre alegre, sempre sorrindo; então tenta ficar alegre. Mas a sua energia agora está triste, e você está tentando ficar alegre. Então você entra em um conflito com sua própria natureza, porque você está tentando transformá-la e isso não é possível.

     Agindo dessa forma, você não vive o que a sua natureza está pedindo para você viver, e também não vive a alegria que você queria viver, porque você não pode moldar a energia a seu gosto. Ela é o que é, e vai ser sempre assim. Há um propósito para todas as suas variações, e agindo dessa forma você perde este propósito.
     Você perde a sintonia, perde o contato com a natureza. Então vem o sentimento de estar perdido. Você sempre se sentirá perdido enquanto não se deixar ser conduzido pelo movimento, porque ele continuará independente de você querer ou não.

     Há duas opções de se viver:
     O sábio, acompanha o movimento, do jeito que ele é. Se é triste, é triste. Se é alegre, é alegre. Se confuso, é confuso. Se tenso, é tenso. Se é raiva, é raiva. E, acompanhando o movimento, o sábio está acompanhando a própria vida. Então ele entra em sintonia. Por estar assim - em sintonia - acaba recebendo tudo o que a vida lhe oferece, e encontra o propósito para cada gota de sensação.
     O não-sábio, tenta moldar o que sente. O movimento está seguindo, e ele está tentando pará-lo, fixá-lo em algum ponto. Então ele entra em um conflito, porque não é possível, é como nadar contra a corrente. Quanto mais tenta moldar, mais conflito. Agindo assim, ele acaba negando tudo o que a natureza quer lhe oferecer, e não encontra o propósito de cada sensação que lhe vem. O não-sábio vive então com um sentimento constante de estar perdido, das coisas não fazerem sentido.

     A paz se encontra na transcendência do movimento. Transcendê-lo é aceitá-lo em absoluto, acompanhá-lo em absoluto; sem nenhum questionamento de: "não deveria ser assim".
     Se é assim, é assim. E você transcende-o porque descobre a razão, o porquê do movimento. Ele passa a fazer sentido. Você descobre a sintonia, e então com isso vem a paz. Você não é mais vítima do movimento, você se descobre abençoado por causa dele.
     Com a sintonia, vem os milagres, porque a vida é milagrosa. Ela é sincrônica, harmônica e perfeita; como uma orquestra. Ela é mágica, como uma melodia. Mas, para ela ser o que ela é, é preciso estar com ela do jeito que ela é. Vivê-la exatamente como ela é, totalmente.

     Não há mal nenhum nessa variação constante, pelo contrário, isso é significado de riqueza. Os que querem estar sempre alegres - perdoe-me a sinceridade absoluta - mas isso é pobreza! Mendigagem! É pedir esmola pra vida.
     E a vida é tão rica, tão ampla... E é simples, você apenas não vê. É uma falta de entendimento, uma falta de compreensão. Todo este espectro emocional, essa variação; é riqueza, é preenchedor. É um peito cheio, um coração rico, vivo. E você descobre isso apenas se vivê-la, se viver o movimento plenamente. 

     A vida quer te dar mil reais, mas você insiste em ficar com a nota de um. A nota de um... A nota de um... A nota de um... O tempo todo você mendigando a nota de um. E ainda fica se questionando: "porque eu sou tão pobre? Porque a vida não é boa?"
     É você quem esteve recusando-a. Sempre foi você.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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quarta-feira, 26 de março de 2014

A Fonte Eterna ( Parte 2 de 2 )




     O jovem foi caminhando cada vez para mais dentro daquela caverna. 
     Era uma descida bem inclinada, as vezes menos, as vezes mais; mas sempre com algumas tochas penduradas nas paredes da rocha, que davam um pouco de luz e indicavam o caminho.
     Depois de trinta minutos de caminhada, o jovem chegou a um salão circular onde não havia continuidade, era um beco sem saída. No meio do salão havia uma pedra alta, com um metro de altura mais ou menos, com um cristal do tamanho de uma cabeça em cima, no meio, azul, irradiando uma luz do centro, que iluminava todo aquele salão.
     Aquele deveria ser o cristal que o ancião falara. Tudo o que ele precisava fazer era tocá-lo e sua jornada começaria. O rapaz sentiu um frio na barriga.

     Ele ficou um tempo contemplando aquele cristal à distância, pensando: será que devo mesmo fazer isso?
     Sua intuição lhe dizia que, ao tocar, muita coisa aconteceria. Ele sentia grande agitação só em se projetar mentalmente tocando o cristal. Mas ele já estava ali.
     Agora que estava numa aventura, ele até se esquecera dos seus problemas que tinha na cidade. Se esquecera das angústias, dos relacionamentos, da família... Se esquecera dele mesmo, de tudo.
     Mas sabia que estava lá, que se voltasse, tudo voltaria a ser como era.
     Ele não ia voltar para continuar vivendo aquela bosta, ele ia tocar o cristal sim. Estava decidido.

     Então ele foi se aproximando do cristal, lentamente, enquanto sua mente tagarelava confusa: "não toque! Toque! É perigoso. Vá! Toque! É melhor não..."
     Ele apenas não dava ouvidos e continuava a caminhar.
     Quando tocou o cristal, ele sentiu algo estranho.
     Uma onda começou a sair do peito dele para fora, e ela não parava de sair. Era como se tivessem feito um furo numa bola de ar e a bola de ar começasse a esvaziar.
     Aquilo não parou. Começou a sair uma onda mais forte, mais forte, e cada vez mais forte, até que ele sentiu um solavanco dentro do peito dele puxando ele.
     Aquele movimento começou a sugá-lo.
     A cabeça dele começou a entrar no peito, o pescoço também, acompanhados das pernas e do tronco.
     Ele desapareceu.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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terça-feira, 25 de março de 2014

A Fonte Eterna ( Parte 1 de 2 )


     Aquele jovem conhecia um ancião, um rapaz muito sábio, que havia dito a ele uma frase, quando ele ainda era um menino, que nunca saíra de sua cabeça:
     - Quando você estiver cansado do mundo, quando estiver decepcionado com a vida como ela tem sido, quando quiser um viver diferente, com emoções, paz, cor e muita vida; volte a mim. Eu tenho uma jornada para você. A jornada da iluminação.
     O velho sábio havia dito também que havia um tempo certo para cada um iniciar a jornada, e que isso era um plano exclusivo da vida, mas que ela sempre chegava a quem, e, no momento certo. Disse ainda que o jovem deveria viver um pouco mais, pois ele ainda não tinha atingido o pré-quesito necessário para a jornada: a desistência.

     Na época, ele era apenas um garoto, e não havia entendido muito bem tudo o que o ancião havia dito; mas aquilo nunca saíra de sua memória.
     Hoje, já adulto, as coisas começaram a fazer mais sentido. As palavras do ancião foram ganhando vida e entendimento, à medida que ele foi crescendo.
     Ele houvera passado por muitas decepções, tanto no lado profissional, quanto nos relacionamentos íntimos, família e amizades; e tudo isso o fizera sofrer bastante.
     Sempre que ele entrava em uma crise de angústia, um eco vinha na sua mente, era a voz do ancião: “... quando estiver decepcionado com a vida como ela tem sido, quando quiser um viver diferente... Volte a mim.”

     Ele estava bastante decepcionado com a vida, totalmente. Era certo que ele queria um viver diferente, aquilo já tinha passado dos limites. É, a vida tinha perdido todo o sentido... Era hora de procurar o ancião.

     Lá foi ele em busca do ancião...
     O ancião morava perto do bosque, numa grutinha próxima à saída da cidade, bem nos limites dela. Ele deixava a grutinha sempre enfeitada e perfumada. Era sempre gostoso entrar lá. Todos os dias ele mudava a decoração. Às vezes tinha estrelas, às vezes flores... Às vezes só algumas velas, uma em cada canto. Ele era muito criativo.
     Como não tinha iluminação lá dentro, o pessoal da cidade, que constantemente o buscava para pedir conselhos, sempre o presenteava com velas coloridas e perfumadas, em sinal de gratidão. O ancião adorava.

     Quando chegou lá, o ancião, como se já soubesse, antes mesmo dele falar, disse:
     - Está preparado?
     O jovem confirmou com a cabeça, dizendo logo em seguida:
     - Cansei de tudo, tudo está uma bosta. Nada faz sentido, eu não consigo manter nada fixo. Nenhum relacionamento, nenhum emprego... Nem as minhas vontades são fixas. Eu não compreendo mais nada, estou perdido. Completamente desiludido e confuso.
     O ancião abriu um largo sorriso:
     - Perfeito!!! - Exclamou ele, animado, estendendo as mãos para cima. - Antes, vamos tomar uma xícara de chá... Acabei de botar a água para esquentar...

     Depois que a água já estava fervendo, o ancião pegou duas xícaras, inseriu o sachê de chá, e colocou água quente até a borda. Enquanto esperava o chá diluir, o ancião abriu uma gavetinha, e tirou um fumo.
     - Quer um pouco? - Disse o ancião, oferecendo fumo ao rapaz.
     - Não, obrigado - negou o jovem. - Eu não fumo.

     Então o ancião enrolou o fumo, levou ele à boca, enquanto pegava as xícaras e sentava-se ao lado do rapaz, entregando uma das xícaras na mão dele.
     O ancião acendeu o fumo, e eles tomaram o primeiro gole de chá.

     - Eu devo lhe alertar - disse o ancião, soltando a primeira tragado de seu fumo -, não é uma jornada simples, mas no fim dela, o pagamento vale todas as vidas que você possivelmente já viveu.
     - Você já trilhou ela? - Perguntou o jovem.
     O ancião deu uma gargalhada.
     - Ainda não - respondeu o ancião. - Mas me contaram que é assim e eu quero ver se é verdade através de sua experiência.
     O jovem ficou incrédulo.
     - Como assim?! - Disse ele, irritado. - Você está me mandando fazer e falando de uma coisa que nunca viveu?
     - Uhum - confirmou o velho, sorrindo e soltando um pouco mais de fumaça. - Relaxe, você vai ser a cobaia, então descobriremos se é verdade.
     O jovem se levantou, bastante nervoso.
     - Você deve estar achando que eu sou algum idiota, não é? - Perguntou ao velho. - Eu não vou participar dessa maluquice, faça isso você... E eu que confiei em você a minha vida inteira... Que idiota que eu sou... Eu vou é embora - e começou a andar.

     O ancião caiu na gargalhada de novo. Enquanto ria, fazia um gesto de mãos, sinalizando para o rapaz esperar.
     - Sente-se, meu querido - disse ele, concertando-se do riso. - Eu estava apenas brincando, queria ver sua reação. Foi divertido. É claro que eu já trilhei, por isso falo do caminho com tanta convicção e clareza.
     O jovem voltou-se a sentar, dando um sorrisinho sem graça. Ele estava se sentindo ridículo.

     - Você precisa entrar na Caverna das Profundidades - começou a contar o ancião -, e ir caminhando para mais fundo nela até encontrar a Fonte Eterna. Quando encontrá-la, ela te ilumina e preenche sua vida de bençãos, iluminando também grande parte das pessoas do planeta.
     - Não parece tarefa difícil - completou o rapaz. - Eu acho que posso fazer isso.
     - É aí que você se engana - disse o ancião, sério. - A caverna é protegida pelos Espíritos da Eternidade. O trabalho deles é garantir que só o buscador sério encontre a Fonte Eterna, mantendo ela assim segura de mal intencionados. Eles confundem e testam o buscador até ele desistir. É tentador. Raríssimos buscadores vão até o fim, mas são estes que encontram a Fonte Eterna e dão continuidade à iluminação do planeta. Se o buscador foi até o fim, sem desistir, ele é um buscador real. Ele se torna um rei, a Fonte Eterna se encarrega de torná-lo um rei.
     - Não é para qualquer um - contou o ancião.
     - Ainda assim, não parece tarefa difícil - disse o rapaz.
     O ancião deu um sorriso maldoso.
     - Você é muito confiante - afirmou ele. - Vamos ver até onde essa confiança te leva. Você quer mesmo fazer isso?
     - Quero - confirmou o rapaz, decidido.
     - Hum... - Deixou escapar o ancião.

     Então eles tomaram o resto da xícara de chá em silêncio, enquanto o ancião tocava fogo em seu fumo.
     Terminado os dois, o ancião se levantou, pegou as xícaras vazias, as colocou em um canto da gruta, e disse: - vamos andando.

     Eles se levantaram e saíram da gruta, caminhando em direção ao bosque.
     No caminho, o ancião foi contando que a Caverna das Profundidades estava escondida no bosque, e que ele poderia apenas mostrar a entrada do caminho. O rapaz é que teria que entrar e caminhar sozinho.
     Ele contou também que é uma caminhada absolutamente solitária, que os passos são únicos, próprios e exclusivos de cada um, então ninguém poderia ajudar. Só ele poderia caminhar, ou desistir, se preferir.

     Ainda caminhando...

     - Ancião...
     - Pois não?
     - O que a Fonte Eterna faz? - Perguntou o rapaz.
     - Você saberá quando encontrá-la - respondeu o ancião.
     - E como ela é? - Perguntou novamente o rapaz.
     - Você saberá quando encontrá-la - disse o ancião.
     - E como eu vou saber que a encontrei, então? - Perguntou mais uma vez o rapaz, impaciente.
     - Você também saberá - respondeu o ancião. - Quando você souber, é porque a encontrou, então saberá, porque sabe.
     O rapaz não entendeu bulhufas. Mas a conclusão que ele tirou era a de que, se ele um dia conseguir, ele vai saber que conseguiu. Então se ainda não souber que conseguiu, é porque ainda não conseguiu.

     Eles caminharam então mais um pouco para dentro do bosque e, finalmente, depois de longa caminhada, chegaram até uma caverna.

     - É aqui - disse o ancião, apontando para a caverna. - Eu não posso entrar com você, você tem que entrar sozinho. Eu só posso mostrar a entrada do caminho, é você quem tem que seguir, independente de mim.
     - Ok - confirmou o rapaz. - Mas o que eu preciso fazer?
     - Dentro da caverna, há uma pedra de cristal azul, em cima de um suporte - contou o ancião. - Não há como errar, ela é bem chamativa, bem característica. Emite uma luz forte.
     - Certo - confirmou o rapaz, com um aceno de cabeça, demonstrando que estava atento.
     - Toque nela - continuou o ancião -, e sua jornada começará.
     - Só isso? - Perguntou o rapaz.
     - Só - confirmou o ancião. - Pode ir.
     - Mas o que vai acontecer quando eu tocar nela? - Perguntou o rapaz, meio desentendido.
     - Eu não sei - respondeu o ancião, desapontando o garoto. - Isso eu não posso responder, depende de cada um. A jornada começará, isto é tudo o que eu posso dizer.
     - Tudo bem - resmungou o rapaz, se sentindo estranho. Ele estava sentindo um pouco de apreensão, sem a informação do que aconteceria. - É assim com todos, não é?
     - Exatamente - confirmou o ancião. - Tem que ser corajoso, estar disposto a correr riscos, cegamente.
     - Está bem - respondeu o rapaz. - Vou indo.
     - Vá.

     Então o jovem deu um passo à frente e começou a caminhar. Logo que entrou na caverna, o ancião veio correndo...
     - Espere!! - Gritou ele.
     - Ahn? - Respondeu o jovem.
     - Siga seu coração, não importa o que seja, não caia em tentação - disse o ancião, com um ar bem sério. - Agora vá, boa sorte.
     - Ok - respondeu o rapaz, agradecido.

     O ancião foi então voltando para a gruta, dizendo para si mesmo no caminho: - pobre rapaz... Pobre rapaz...



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A Sementinha que Esmorece




     Ele era um garoto um pouco perturbado, inquieto, até chato. Mas não era a vontade dele ser assim, ele simplesmente era assim, ele nem sabia o porque.
     Quando menino, ele não gostava de ir para a escola. Seus pais o forçavam a ir, dizendo que toda criança deveria ir para o colégio, e isso rendia uma grande briga dentro de casa. Então ele ia, de carra amarrada e chateado. Todo dia era assim. Ele não tinha poder de palavra contra seus pais.
     Durante as aulas, ele ficava inquieto, sacudindo as pernas. Não conseguia prestar atenção nas aulas; ficava imaginando mil e uma coisas, sonhando... Ficava desenhando no caderno, escrevendo versos... Tudo era possível, menos ouvir a voz do professor. Isso era péssimo, porque quando vinham os exames, o garoto sempre se dava mal, e isso rendia mais brigas dentro de casa. Sua auto-estima ia lá para baixo.

     Ele gostava de música, de pintura, de filmes... Mas era proibido pelos seus pais de ouvir, pintar ou assistir, há não ser que estudasse. Ele odiava estudar, simplesmente não conseguia. Ele não compreendia como existiam pessoas que se davam bem com os estudos, era algo impossível para ele; e seus pais não conseguiam entender isso, porque sempre foram muito estudiosos.
     Quando ele ia estudar, começava a ler e as palavras se embaralhavam em sua mente e ele não entendia coisa alguma. Era horrível, ele sentia-se péssimo. Sua auto-estima ia lá para baixo.
     Então ele não podia fazer o que gostava, e era obrigado a fazer o que não gostava. Isso o deixava sempre perturbado e infeliz.

     Em uma dessas noites, seus pais saíram de casa para um jantar. Então, ele, esperto, foi correndo para a televisão e a ligou.
     Enquanto estava trocando os canais à procura de um filme, passou por um canal onde estava passando um desenho animado que, por alguma razão desconhecida, despertou a atenção dele e ele parou.
     Era uma floricultora e um garotinho, cuidando de uma sementinha. A semente tinha olhos e boca, e a floricultora estava contando para o garoto:

     - A semente quer crescer, para dar frutos e flores. Ela ficará muito feliz em dar frutos e flores, e assim presentear toda a fauna e a flora. Da até para sentir a alegria da planta quando está acontecendo...
     - Ela nasceu para isso - continuou a floricultora -, é isso que a trará alegrias. Nós temos que cuidar dela, dar o que ela precisa: regar, colocar ela debaixo da terra, e ficar atento para que nada estrague ela. Se nós não dermos as condições da semente crescer, se não a deixarmos em um local onde ela possa crescer - neste caso, debaixo de terra nutritiva -, olha o que acontece...

     Então a floricultora pegou a semente, com cuidado, que estava sobre a terra, e a colocou em cima da mesa, num lugar onde ela não poderia germinar. A semente, que tinha olhos e boca; estava feliz, alegre, sorridente e radiante. Quando ela foi colocada em cima da mesa, aos poucos, o seu sorriso foi esmorecendo... Depois que ela já estava um bom tempo de carinha triste, ela começou a se debater para os lados, inquieta...

     - A semente nasceu para ser uma linda árvore - contou a floricultora para o garoto. - É uma super oportunidade para ela. É muita alegria, e ela intuitivamente sabe disso. Quando a deixamos num ambiente onde ela percebe, intuitivamente - e isso não é muito claro -, que ela não irá crescer a linda árvore que ela veio para ser; ela começa a ficar agitada e inquieta, porque seu mais íntimo coração sabe que ela pode estar perdendo sua grande oportunidade de viver, estando ali...

     O menino apertou o botão de desligar a TV, na mesma hora. Aquilo foi estranho, ele sentiu medo. Aquele desenho parecia que estava falando com ele...
     Saiu correndo e acendeu a luz, sentindo uma boa dose de medo corroendo seu estômago. Pensou em ligar para seus pais, mas o que ele iria contar? Que estava assistindo TV e um programa falou com ele? Além de se entregar, porque não podia ter ligado a TV, aquilo parecia ser bastante idiota de se contar.
     Então ele resolveu ficar ali mesmo, sentado no sofá, repetindo para si mesmo: "vai passar... Vai passar..."


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segunda-feira, 24 de março de 2014

O Príncipe Perdido


     Ele crescera como um garoto comum, como todos.
     Durante a infância, sempre foi um menino muito sonhador e apaixonado. Era muito inteligente, ágil, criativo e esperto. Um pouco tímido e medroso, mas um garoto de bom coração.
     Ele vivia intensas paixões, a maioria em segredo. Ele tinha medo de revelá-las, mas era um garoto muito apaixonado. Ele escrevia nas paredes, no box do chuveiro, quando ouvia música imaginava... Tudo em relação à pessoa amada. Era muito sonhador, e ele gostava disso.
     O estranho disso tudo é que suas paixões sempre foram inocentes. Não eram carnais, totalmente pelo contrário. Quando ele se apaixonava por alguém, ele não pensava na carne, só no sentimento. Só na beleza, só no amor. A carne era irrelevante... Mais do que isso, era até negada por ele. Ele sentia como se o lado carnal estragasse o sentimento, e o evitava à finco.

     Desde pequeno, ele manteve sempre uma forte noção de amizade. Talvez fosse exacerbado, porque era tipo uma idealização, e isso atrapalhava o que acontecia na realidade... Mas ele nunca a quebrou, sempre a manteve. Ele sempre imaginou a amizade como algo sagrado, inquebrável, fiel, sem curvas, até romântico... Quase divino. A forma como ele via a amizade nunca fora correspondida com a realidade, mas ainda assim, ele acreditava na forma que ele via, e manteve isso mesmo não acontecendo.

     Quando foi crescendo, ele percebeu que o que carregava dentro de si, não correspondia com o que era visto lá fora. O amor que ele via e que sentia, nunca era igual ao recebido. A noção de amizade que ele tinha e agia por, nunca era igual à recebida. Talvez isso acontecesse com muita gente, e essa gente moldasse seus "modelos" internos para se ajustar à realidade... Mas não foi assim com esse garoto, simplesmente ele não agia assim. Por mais que houvesse choque entre seu íntimo e a realidade, ele mantinha o íntimo, independente das decepções.

     Talvez isso tenha se tornando um problema, porque, como ele mantinha o íntimo inocente, e as pessoas lá fora o moldavam para se ajustar, o garoto foi ficando desajustado. Ele mantinha a semente doce do amor, mas não podia amar porque a semente receptora havia sido destruída. Ele mantinha o doce sentimento da amizade, mas não podia vivê-la porque aquele sentimento só existia nele. Aos poucos, o garoto foi se tornando um estranho...

     Quando foi chegando à fase adulta, essa estranheza foi ficando mais visível. As pessoas seguiam por um caminho: moldando seu íntimo à realidade; e o garoto seguia por outro: mantendo seu íntimo independente da realidade; então, já adulto, essa diferença ficou muito extrema. As pessoas já tinham caminhado demais, e o garoto continuava no mesmo lugar; puro e inocente.

     A pureza inocente é frágil, como uma criança, e era exatamente assim que aquele garoto adulto ainda se sentia. Quando ele se aproximava dos outros adultos de sua idade, algo acontecia de estranho. Dentro dele, algo se tremia, algo se abalava. Os adultos faziam seu interior temer. O modo como eles agiam, o modo como falavam, a energia que emitiam... Simplesmente era pesada demais para o que havia dentro do garoto. Era uma pedrada.
     O garoto não entendia muito bem o que acontecia, ficava muito confuso. Então, intuitivamente, passou a se afastar das pessoas. Passou então a andar muito tempo só. Esses momentos foram de ouro.

     Andando sozinho, o garoto foi ficando cada vez mais conectado consigo mesmo, mais alerta e crescido em entendimento. Ele ganhou plena clareza de percepção quanto às suas sensações e movimentos internos.
     Ele ficou íntimo de si mesmo. Ele agora enxergava o seu amor ainda puro, sua amizade doce no coração, e passou a perceber como os humanos adultos machucavam seu interior apenas em se aproximar. Apenas em chegar perto.

     Como não tinha como dar fluxo ao seus belos sentimentos com os seres humanos, ele passou a jogá-los ao vento. Passou a escrever, sonhar, sentir, dar às flores, aos animais... E sempre com tentativas, mal sucedidas, de dá-los também aos seres humanos. O que ele queria mesmo, o foco de seu amor, eram os seres humanos. Era um desejo não satisfeito. E, como era de manter o seu íntimo natural, ele mantinha esse desejo mesmo não conseguindo satisfazê-lo.

     Com o tempo, com o estar sozinho cultivando seus sentimentos com o vento, eles foram crescendo. O interior do garoto foi ficando mais vivo, mais preenchido, mais cheio daquilo. Então, agora, as outras pessoas caminhavam e ele também. Antes, elas caminhavam e ele continuava na inocência. Agora ambos estavam caminhando. O garoto caminhava crescendo sua beleza interna, e os outros caminhavam crescendo sua dureza e astúcia interna. Então agora é que eles foram ficando ainda mais pólos distantes.

     Se antes o garoto se tremia com o falar, energia e aproximação das outras pessoas; agora acontecia pior. Ele era mais sensível ainda. Mas agora era um pouco diferente, porque ele estava crescido em si mesmo. Ele não ficava mais confuso, ele via com clareza o que estava acontecendo, porque se conhecia. Então ele aprendeu o seu caminho, o caminho para se manter seguro. Ele agora cuidava de si mesmo. Afastava-se quando preciso, defendia-se quando preciso, consciente do que estava fazendo.

     O garoto, de tão estranho, foi perdendo a capacidade de conviver no meio social comum. O que ele cultivou dentro, não condizia com a sociedade. Era demais para a sociedade e a sociedade era demais para ele. Ele sabia disso. Ainda assim, optou pela beleza. E ele continuava caminhando... Sonhando com belas pessoas, como ele, que cultivavam a pureza, beleza e magia de viver...

     Todo aquele mar de sentimentos já estava grande demais dentro dele, ele já não conseguia se conter... Ele começou a vomitá-los, alguma coisa ia acontecer...




~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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domingo, 23 de março de 2014

I want to live


Carry me like a gold piece
Make me cross the ocean sea
Reveal my beeing to the whole world
This place is so small, I am bigger than it all

Love means everything to me
I want to live it like a child wants to be
So please, make the move
Remove me
Carry me

Make the love finds me
I am not modest
I feel like a king

If a grape doesn't tastes well
I know that the world is full of grapes
I feel like they were all made to me
I am not modest
I was born to be

I can't hold on anymore
I am too excited for the world
I am too happy for the world
I am too beautifull for the world
I am too lovely for the world

I am too poetic for the stone
I am too peacefull for the war
I am too young for the old
I am too alive for the death
I am too flower for the empty tree
I am too, too much

And you, you are so ugly...

I can't hold on anymore
Life is turning crazy inside me
Carry me on
I want to live
I want to be!


~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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O Portão Escuro


     Chateado com a vida, com as coisas nunca acontecendo do jeito que ele queria, ele saiu da cidade e foi caminhando em direção ao bosque. Ele queria ficar sozinho. Isso não era incomum, volta e meia ele sentia essa vontade. Mas ele nunca houvera caminhado para tão distante.
     Do jeito que as coisas estavam andando em sua vida, ele já estava praticamente desistindo, pensava até em suicídio.

     Andando pelo bosque, sem rumo, encontrou uma pedra alta, próxima de um rio. Ele a escalou e sentou-se no topo, sentindo toda aquela angústia sufocante no peito.
     Ele olhava para o caminho que tinha subido, e tinha pensamentos suicidas. Pensava em pular da pedra, de cabeça no chão.
     Olhava para o rio e também tinha pensamentos suicidas. Pensava em se jogar no rio e deixar a corrente o levar até uma cachoeira. Quem sabe depois de sua morte ela não fosse chamada de Cachoeira da Morte. Ele achou aquele pensamento engraçado, até riu consigo mesmo.

     Esses pensamentos eram espontâneos, aconteciam em sua mente contra a vontade dele. No fundo, ele não queria mesmo se matar, aquilo era só momento. Ele acreditava que a vida era boa em algum sentido, ele só não estava enxergando isso agora.
     Ele acreditava que a vida era beleza, era amor, era alegria, era mágica e poética. Então ele acreditava que ele apenas estava perdido, pois não estava sentindo nada daquilo. Talvez isso tudo fosse idealização dele, a vida como um sonho... Ainda assim, era espontâneo. Ele carregava aquela crença com ele desde pequeno, aquilo nascera com ele.

     Por carregar aquilo desde sempre, ele não aceitava a vida sofrida. Quando estava sofrendo, para ele, algo deveria estar errado, porque a vida não era para ser assim.
     Isso o fez sempre ser um garoto estranho, porque as pessoas pareciam estar acostumadas, habituadas e aceitas ao sofrimento. Como se o sofrimento fosse algo normal, como se a vida fosse mesmo sofrida. O garoto não aceitava isso. Ele ficava inquieto, confuso e agitado. E como as pessoas aceitavam, dizendo que é assim que a vida é, o garoto parecia estranho. Diferente de todos.

     Um pássaro pequeno veio voando lá de longe, piando alto, e despertando a atenção do garoto. O pássaro vinha na direção dele.
     O pássaro foi se aproximando e pousou num pedaço alto da pedra, bem próximo ao garoto, ficando praticamente na altura do pescoço dele.
     O garoto pensou que se ele se movesse, assustaria o pássaro, e ele não queria isso. Estava achando interessante aquele pássaro perto dele. Então ficou quietinho, apenas olhando para o pássaro.
     O pássaro, estranhamente, ficou olhando fundo nos olhos do garoto, frente a frente. 
     Aquilo era muito estranho, o olhar negro do pássaro estava muito fixo nos olhos do menino. O pássaro apenas piscava, mas não desviava o olhar. Era como se ele estivesse reconhecendo o garoto.
     O garoto, intrigado, ficou olhando também para os olhos do pássaro, se sentindo um pouco incomodado, com um pouco de medo, mas ainda maior do que isso era o seu interesse naquele olhar curioso do pássaro.
     O passarinho então coçou as penas com o bico, desviando o olhar do garoto, e depois tornou a observá-lo nos olhos.
     O garoto tomou um susto quando o passarinho olhou de volta, seus olhos eram duas chamas de fogo. Mas depois de três segundos, voltaram a ser negros. O menino ficou sem entender, achando que aquilo foi uma miragem.

     O passarinho abriu as asas e as esticou de ponta a ponta, levantando o pescoço e fazendo uma pose confiante, como se estivesse se exibindo. Então iniciou voo, se distanciando da pedra, e parando lá em baixo, na base do bosque, em cima de uma estaca de madeira.
     Assim que parou, o pássaro virou os olhos para o garoto e o ficou olhando novamente, agora lá de baixo. Ele parecia querer dizer alguma coisa... O garoto achou que era para segui-lo, então desceu a pedra, e caminhou na direção do pássaro.

     Quando estava se aproximando do pássaro, este abriu as asas e levantou voo. Voando lentamente.
     Ele dava um salto, e parava um pouco distante. O garoto o seguia e ele dava um novo salto, parando novamente a uma certa distância.
     O garoto o foi seguindo. Eles foram andando por um caminho por entre as árvores, até que chegaram em uma ladeira.
     Havia uma muro de pedra na ponta da ladeira. O passarinho voou e pousou ao lado do muro de pedra.
     O garoto subiu a ladeira, bastante inclinada, e parou perto do pássaro. Ele não voou. Ficou quietinho, olhando para o garoto.
     Ficou assim por um tempo...

     - O que você quer? - Disse o garoto, sem saber o que fazer.
     O pássaro continuou quieto, apenas bateu as asas e se ajeitou confortavelmente.
     O garoto ficou olhando para o pássaro, sem entender.

     Depois de um tempo, o pássaro piou alto, assustando o garoto porque foi repentino, e bateu com o bico no muro de pedra. O muro de pedra foi se abrindo lentamente, como um portão.
     O garoto ficou olhando aquilo, curioso.
     Assim que o muro foi se abrindo, o ar começou a ser sugado em uma rajada para dentro dele, como se houvesse um vácuo lá dentro.
     Era escuro lá dentro, não dava para ver o que havia lá.
     Quando o portão terminou de se abrir, o pássaro levantou voo e foi para a outra lateral do portão, pousando num alto relevo do muro. Ficou olhando para o garoto. O garoto continuava sem entender.
     O garoto se aproximou do portão, para olhar melhor. Não havia nada lá dentro, puro vazio, sugando o vento. Um breu total. Dava medo.

     - Se você me trouxe aqui e abriu o portão... Você está querendo que eu entre, não é? - Disse o garoto para o pássaro.
     O pássaro continuou imóvel, olhando para ele.
     - Eu não vou entrar aí, não tem nada lá dentro, só sombras - disse o garoto. - Dá medo...
     O pássaro continuou imóvel, olhando para o garoto.
     Havia algo diferente naquele pássaro; ele era calmo, não tinha medo. No geral, os pássaros sempre mantinham um olhar distante, um pouco assustados... Mas esse pássaro não, ele tinha um olhar profundo... O olhar dele comunicava algo que não há como descrever. O garoto sentia isso, o olhar do pássaro falava com ele...

     - Você quer mesmo que eu entre aí, não é? - Disse o garoto novamente para o pássaro.
     O pássaro continuava imóvel. Volta e meia sacudia as asas, mas então voltava o olhar ao garoto.
     - O que tem de interessante aí dentro? - Disse o garoto para si mesmo, se aproximando um pouco mais do portão.
     O pássaro acompanhava o movimento do garoto com o olhar, excepcionalmente atento.
     Não havia nada lá dentro, só escuridão.

     - Ah, eu vou entrar - disse o garoto, com firmeza. - To cansado disso tudo aqui, to nem aí.
     Então o garoto entrou.
     Assim que entrou, o garoto estranhou.
     Logo que atravessou a escuridão, ele estava no mesmo lugar, igualzinho. As mesmas árvores, o mesmo muro, o mesmo gramado... O mesmo lugar. Apenas o pássaro não estava lá.
     Ele olhou para trás e havia o mesmo portão, imerso numa profunda escuridão, então olhou para a frente de novo.

     Que coisa estranha - Pensou ele.

     O menino olhou para o ambiente com mais atenção. Ele estava enganado.
     Era o mesmo lugar, porém estava muito diferente. As árvores estavam brilhando, pareciam vivas. As folhas caíam das árvores parecendo uma melodia, uma melodia muito silente. O gramado estava estonteante, um verde muito vivo.
     Os olhos do garoto brilhavam ao observar aquela paisagem. Toda aquela paisagem tocava o garoto. Cada folha, cada árvore, cada balançada do vento; transmitia algo a ele. Comunicava alguma coisa. Estava tudo vivo. Tudo isso, com feixes de luz do sol cortando por entre as folhas, era magnificamente magnífico. Era uma pintura, uma obra de arte. Uma contemplação.
     Foi então que o garoto ouviu um barulho atrás dele, vindo do portão. Virou-se na mesma hora.
     Um bico saiu de dentro daquela escuridão, acompanhado por uma pelagem vermelha-alaranjada faiscante, em chamas. Era um pássaro, um pássaro dez vezes maior que aquele. Sua pelagem pegava fogo.
     Ele atravessou o portão e passou à frente do garoto, dando um voo circular, exibindo três lindas caudas, com penas coloridas, alternando entre laranja e vermelho, e algumas pingadas azuis... Todas imersas em chamas.
     Depois do voo exibicionista, ele passou novamente pelo garoto e pousou na lateral do portão, no mesmo alto relevo em que o outro pássaro estava.
     Logo que pousou, olhou para o garoto. Era aquele mesmo olhar profundo. O garoto reconheceu, era o mesmo pássaro.

     - O que aconteceu com você? - Perguntou o garoto.
     - Essa sou eu - respondeu o pássaro. Ele tinha uma voz doce, tranquila, feminina.
     O menino tomou um susto ao ouvir uma resposta. Ele não esperava por isso.
     - A magia e a realidade estão lado a lado - contou o pássaro. - Tudo o que é preciso é atravessar um portão escuro.
     - Essa sou eu - continuou o pássaro -, mas você não podia me ver porque não enxergava a magia. Não me vendo, eu não posso falar com você, você não pode me compreender.
     - As vezes, nós, mágicos - continuou o pássaro -, temos que entrar no mundo de vocês, tentar nos comunicar com vocês sem poder falar, apenas para resgatar e reviver vocês. Vocês sofrem porque não enxergam a magia, e tudo o que é preciso é atravessar um portão escuro.




~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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The Real Monster


~*~

The real monster is inside your skin,
You have never saw him.


~
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sábado, 22 de março de 2014

Follow


~*~

Follow your nature, Darkwalker...

~
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quinta-feira, 20 de março de 2014

The way you move on


     There are two ways of moving on in life.

     In one of then, you follow the energy, in the other, you fight against it.

     When you follow the energy - life is easy and flows like a river, in totally harmony.
     When you fight against it - you live in constant conflict: the energy tells one thing and you tell another.

     The energy is neutral itself.
     The self that wants to modify this energy is not neutral.

     Neutrality created flowers, lions, rivers and skies; and kept then on an eternal harmony since they got born.

     Neutrality feeds birds, cats, dogs and brings nutrition to the forest.

     Neutrality paints on butterflies, flowers and peacocks.

     Neutrality makes the love possible.


     Non-neutrality created buildings, walls, conflicts and wars; and keep on doing it.


     You should think very intensily on which way you may follow.



~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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~ ~                   ~ ~                   Tradução:                   ~ ~                   ~ ~

Há duas formas de se mover na vida. Em uma delas, você segue a energia, na outra, você luta contra ela.

Quando você segue a energia - a vida é fácil e flui como um rio, em total harmonia.
Quando você luta contra ela - você vive em constante conflito: a energia diz uma coisa e você diz outra.

A energia é neutra por ela mesma.
O eu que quer modificar a energia não é neutro.

A neutralidade criou flores, leões, rios e céus; e manteve eles numa harmonia eterna desde que nasceram.

A neutralidade alimenta pássaros, gatos, cachorros e trás nutrição para a floresta.

A neutralidade pinta em borboletas, flores e pavões.

A neutralidade faz o amor possível.

A não-neutralidade criou prédios, muros, conflitos e guerras; e segue os criando.

Você deveria pensar muito intensamente em qual dos caminhos você vai seguir.

~ ~                   ~ ~                   Tradução:                   ~ ~                   ~ ~