Há muito tempo atrás existia um pequeno vilarejo afastado da cidade, alocado em um bosque. As pessoas que viviam neste vilarejo viviam da agricultura e da caça, e diariamente era preciso muito trabalho, porque o solo não era muito fértil, raramente chovia, e a incidência de pragas era constante. As crianças deste lugar aprendiam a trabalhar logo cedo, cuidando da plantação e caçando, porque era disso que eles sobreviviam.
Neste vilarejo, morava um menino, adolescente, que era mal falado porque não gostava de trabalhar. Seus pais viviam dizendo que ele nunca se casaria, e era constante ele receber críticas, não só dos pais, mas também dos vizinhos, que costumavam chamá-lo de preguiçoso.
Desde pequeno ele teve que suportar esse tipo de ofensa. Na escolinha, os seus colegas costumavam desenhar uma manada de ovelhas brancas, com uma ovelha negra no meio, e eles escreviam o nome dele por cima da ovelha negra.
Ainda pequeno - não resistindo às ofensas e escutando o conselho de seus pais - o menino tentou trabalhar, ajudando na agricultura. Ele se sentia mal fazendo aquilo, era muito esforço para ele.
Seu pai o deixou cuidando de um pedaço de terra de alguns metros quadrados e, durante três tentativas, o menino deixou a praga se espalhar, perdendo toda a sua plantação, inclusive expandindo a praga para a terra que o pai estava cuidando. Seus irmãos começaram então a chamá-lo de imprestável, e depois dessa experiência ele simplesmente desistiu da agricultura.
Tentou também a caça, mas ele era tão desastrado que não conseguia nem ao menos se camuflar no mato. Assim, ele espantava os animais, atrapalhando também as pessoas que estavam caçando junto com ele. Ele resolveu então desistir e assumir para si mesmo que ele não tinha condições de trabalhar. Teve então que suportar as críticas durante toda a sua infância.
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No lado leste daquele vilarejo havia um lago. Um lago enorme, com uma ilha bem no meio. O lago era tão enorme, que para enxergar a ilha era preciso forçar as vistas. Ninguém nunca tinha ido naquela ilha, pois ninguém nunca havia tocado nas águas daquele lago.
A água que corria ali era vermelha, turva, parecendo sangue. Não dava para enxergar nem um palmo abaixo d'água. Contava-se que há milhões de anos, houve uma grande batalha nas terras daquele vilarejo, que definiria a raça que dominaria aquelas terras, e a raça que viveria nela durante toda a eternidade. A história contava que a batalha perdurou por três séculos, e que houveram mais de quinhentos mil mortos. Contava-se ainda que todo o sangue escorrido na batalha percorreu morro abaixo, em direção aos planos baixos, formando aquele grande lago.
Ninguém do vilarejo nunca ousara tocar nas águas daquele lago, pois contava-se ainda que ela era amaldiçoada pelos espíritos dos corpos que morreram por ali. Diziam que se uma gota daquele lago tocasse na pele de alguém, a pele desta pessoa derreteria instantaneamente e o seu sangue escorreria para o lago, juntando sua alma com as almas dos guerreiros que sofreram na batalha. Ninguém desejava isso para si mesmo.
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Ainda pequeno, ele teve também que presenciar a morte de seu querido avô que, antes mesmo de morrer, deu ao menino três sementes de cacau, alegando que estas sementes andariam com ele por toda a vida e que o traria sorte, assim como acontecera com ele. Ele gostava muito desse avô. Ele era a única pessoa que não o criticava e ainda o dizia: "filho, siga o seu coração sempre e não escute o que as pessoas dizem sobre você. Cada um nasce da forma que a natureza requer, e ela sempre terá suas razões".
Apesar de tudo o que vivia, todos os dias ao acordar, ele colocava as sementes que seu avô lhe dera no bolso e dizia para si mesmo: "vovô, eu sei que essas sementes um dia ainda me trarão sorte".
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As pessoas deste vilarejo não precisavam de muito conhecimento para sobreviver, assim as atividades escolares encerravam cedo, aos doze anos. Assim que terminara a escola, ele ainda era bastante mal falado e criticado. Para fugir destas críticas diárias, este menino na maioria dos dias escapava para perto daquele lago de águas vermelhas.
Aquele era o único lugar que as pessoas não costumavam visitar, porque tinham medo. Como este garoto precisou um dia fugir para lá, acabou descobrindo que estando lá, nada acontecia com ele, não tendo então como ter medo. Ele passava grande parte de seus dias ali, sozinho, até agradecido que as pessoas sentiam medo daquele lugar. Ele achava melhor assim, melhor só do que ouvindo críticas.
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Sim, você está certo em pensar que ele não era um garoto muito feliz. Ele quase sempre sentia-se carente e rejeitado, e em alguns de seus dias ele até desejava a morte. Mas isto não o incomodava mais tanto. Com o tempo ele aprendeu a conviver com isso. Às vezes, sem nenhuma razão, ele se sentia contente, esperançoso. Ele sentia que algo bom poderia acontecer a qualquer momento.
Num dia desses, num fim de tarde, sentado perto daquele lago, ele olhou para aquelas águas vermelhas turvas e nasceu uma curiosidade... A cada dia que ele tinha estado ali, a água do lago estava em um nível diferente, e não havia chovido dia nenhum. Aquela água não tinha vindo do sangue das pessoas mortas? Como estava variando de nível então?
Foram quinhentas mil pessoas mortas? - Ele se perguntou. - Três séculos de batalha por este pequeno pedaço de terra? Esta história é estranha... E isso aconteceu a tanto tempo... Como é que esse lago nunca secou? - Sua curiosidade foi aumentando. - E se ele as vezes sobe... Tem que haver mais pessoas morrendo por aqui para entrar mais sangue. - Naquele vilarejo havia tanta pouca gente, que uma morte era um evento meio raro. Eles faziam até uma procissão para cada novo falecido. - Do tempo que comecei a vir aqui, ninguém morreu... Como é que a água deste lago subiu de nível? Isso é estranho... Será que existe vida e gente morrendo naquela ilha? - Ele estava sentindo uma espécie de dúvida investigativa. - Precisaria morrer muita gente para subir toda essa água... Talvez ele seja mesmo amaldiçoado...
Já estava anoitecendo e ali era perigoso à noite. Ele resolveu então voltar para o vilarejo, carregando sua curiosidade junto com ele no caminho.
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Esta noite ele não estava conseguindo dormir. Uma interrogação fora plantada em seu peito e ele não parava de pensar naquele lago. "Será que há vida naquela ilha? Será que aquela história toda é mesmo real?", ele pensava.
Três séculos de batalha são trezentos anos. É tempo demais - pensou. - Um guerreiro com uma espada, acho que conseguiria matar facilmente cem pessoas em um dia -continuou pensando... - Um dia tem vinte e quatro horas. Então se ele matasse quatro pessoas por hora, que é pouco para o tempo, em um dia ele teria matado quase cem. Quinhentos mil dividido por cem, hum... Dá cinco mil. Então matando cem pessoas por dia, em cinco mil dias ele já teria matado todas as quinhentas mil da história. Mas não foram três séculos? - Ele sentiu que havia algo errado. Sua dúvida foi crescendo e fazendo-o investigar ainda mais. - Um ano tem trezentos e sessenta e cinco dias mais ou menos. Então em um século tem trinta e seis mil e quinhentos dias. Matando cem pessoas por dia, em um século seria mais de três milhões de pessoas mortas! Nossa, é gente demais, imagina em três séculos?
Alguma parte desta história está mal contada - continuou refletindo. - E ainda se houver gente morrendo e alimentando o lago pela ilha, de onde veio essa gente? Como é que eles chegaram naquela ilha se eles não poderiam atravessar o lago? - Ele estava sentindo como se estivesse tendo uma grande revelação. - Se há gente do outro lado, o lago pode ser atravessado, ou então grande parte das pessoas foram soterradas quando o lago se formou, e uma parte ficou à salva naquela ilha... Se for assim, há gente ali - a história inteira ficou estranha para ele.
Depois de tanto pensar, o garoto finalmente conseguiu pegar no sono. Ele sonhou com a batalha. Em seu sonho, milhares de pessoas armadas com escudos e espadas até os dentes, lutavam naquela vila. Antes mesmo da luta começar, o lago já estava lá, igualzinho, vermelho turvo. Depois que acabou a batalha, havia aquele mar de corpos mortos espalhados por todo o chão da vila. Devia ter uns mil, e apenas alguns vinte sobreviventes. Estes sobreviventes foram caminhando em direção ao lago vermelho, largaram as armas, despiram as armaduras, e banharam-se naquelas águas turvas. A pele deles não estava derretendo, e depois de banharem-se eles ainda continuavam vivos.
Depois do banho, seu pai apareceu no sonho. Ele gritava com os guerreiros: "vá arrumar o seu quarto! Vá arrumar o seu quarto! Acorde logo moleque!!!"... E, sentindo um grande empurrão, o garoto acordou. Seu pai o balançava para lá e para cá, com força, mandando ele ir arrumar o quarto. Havia dias que ele não o arrumava, estava uma bagunça.
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Como de costume, logo que terminou de almoçar, ele saiu de casa e caminhou novamente em direção ao lago. Só que desta vez era um pouco diferente, ele estava indo para o lago para ver o lago, e não para fugir das críticas. Seus questionamentos do dia anterior, e o seu sonho, o preencheram de mais curiosidade. Ele queria descobrir o que de fato havia acontecido com aquele lago.
No caminho, ele coletou algumas britas e colocou em seus bolsos. Pensou que deveria jogar alguma coisa no lago e verificar o que aconteceria.
Chegando no lago, ele foi caminhando lentamente até a borda. Sentia-se um pouco apreensivo, com medo. Era tanta coisa que contavam sobre aquele lago, diziam que poderia acontecer tanta coisa ruim com quem tocasse nele, que ele estava um pouco assustado por estar se aproximando tanto.
Com medo de chegar muito perto, parou há mais ou menos dois metros de distância, e colocou as mãos em seus bolsos para pegar uma daquelas britas, jogar no lago, e ver o que aconteceria.
Quando foi retirar as mãos dos bolsos, uma daquelas sementes de cacau que sempre carregava foi arrastada do seu bolso para fora junto com sua mão, e então caiu no chão, rolando declive abaixo. Ele pensou, "não! A semente do vovô não!", mas já era tarde, ela já estava descendo em direção ao lago e era melhor ele não se aproximar mais, era perigoso, algo poderia acontecer, ele poderia escorregar.
A semente foi então rolando vagarosamente para o lago. O garoto não tirou os olhos da semente, com tanta atenção, que não piscou o olhar um segundo sequer. Assim que a semente tocou no lago, ele arregalou os olhos, mas nada aconteceu. A semente simplesmente boiou.
O garoto continuou olhando atenciosamente para a semente. Ela foi boiando lentamente para alguns centímetros a mais de distância da borda. Não era possível, nada acontecera? De repente, a semente se mexeu. Ele redobrou a atenção.
A semente se abriu, boiando mesmo, e brotou. Uma muda saiu dela, e foi crescendo, rápido, muito rápido; mas não era cacau, uma linda flor amarela desabrochou daquela muda. Aquela flor era tão linda, que tocou o garoto por dentro. Ele nunca havia visto uma flor como aquela. Naquele momento, houve um silêncio. Tudo o que a atenção dele captava era a flor, o silêncio, e a sua própria respiração, em ritmo suave, como se fosse tudo uma coisa só. Era como se o tempo tivesse parado por alguns segundos. A flor continuou boiando mais um pouco, vagando lentamente para mais distante da borda, e então começou a desaparecer. Ela foi se desfazendo lentamente, se transformando em um pó brilhante, de várias cores, que subia em direção ao céu. Foi uma linda visão.
O garoto, curioso, dispensou as britas que estavam em suas mãos, pegou mais uma semente de cacau das duas que lhe restaram, e arremessou no lago, mais distante, lá para dentro. O mesmo aconteceu, igualzinho, só que dessa vez era uma flor diferente, e ela era roxa. Ele pensou, "esse lago não pode ser tão ruim assim".
Ele ficou observando aquelas águas vermelhas por alguns minutos, pensativo, sentindo grande vontade de tocá-la. Era uma grande tentação. Então ele se aproximou cuidadosamente, em passos curtos, e quando seu pé estava há aproximadamente uns trinta centímetros do lago, ele se agachou, com muito cuidado, apoiou uma mão no chão, e estendeu a outra, esticando o seu corpo para conseguir tocar o lago. Ele se desequilibrou, escorregou, e caiu em cheio nas águas turvas daquele lago.
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Logo que caiu, ele se assustou. O lago era mais fundo do que ele esperava, e ele não tocou o fundo. Era como se houvesse um grande degrau logo na entrada.
No fundo das águas, ele tentou abrir os olhos para enxergar, mas não dava para enxergar coisa alguma. Apenas aquela vermelhidão opaca. Ele tentou nadar para a superfície, mas ao nadar, ele só encontrava água; estava perdido, sem norte. Sentiu medo. Nadou então com mais força, mas foi inútil, ele não encontrou a superfície. Ele achou que ia morrer afogado, estava ficando sem ar. Mas não foi isso o que aconteceu... Ele desmaiou.
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Ele desmaiou, como se o seu corpo tivesse morrido, mas ele continuava consciente. Sua respiração havia parado. Ele não conseguia se mover, mas ele ainda estava consciente de tudo o que estava acontecendo. Como se ele estivesse vivo em seu corpo, mas o seu corpo estivesse morto. Ele sentiu algo encostando nele, no seu braço esquerdo. Logo em seguida, ele sentiu aquele toque vindo de várias direções ao mesmo tempo, preenchendo cada espaço do seu corpo.
Foi então que sentiu uma pressão, em todo o corpo, em direção ao seu centro. A água do lago parecia que estava entrando por dentro dele... Ele não conseguia ver o que estava acontecendo, ele somente sentia. A pressão foi aumentando, e aumentando, parecia que ele ia explodir... E foi exatamente isto o que aconteceu. Ele sentiu seu corpo explodindo, por dentro, mas sua carne não estava explodindo. Era algo dentro dele que estava explodindo. Explodindo em todas as direções ao mesmo tempo. Sua consciência se expandiu, muitíssimo rápido, numa velocidade extrema; e, por alguns milésimos de segundo, ele sentiu o universo inteiro, como se ele fosse tudo aquilo. Tudo parou. Não havia mais nada, ele era tudo. E então perdeu a consciência.
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Ele acordou na borda do lago, sequinho. Ele se levantou, coçou os olhos e olhou à sua volta. Tudo estava diferente, ele estava diferente. As árvores estavam bonitas, radiantes, estavam vivas. Ele nunca tinha visto aquilo. As folhas caíam das árvores lentamente, como se estivessem comunicando alguma coisa, e ele podia sentir isso. As árvores estavam falando com ele.
Virou-se então e olhou para o lago. Que surpresa! O lago estava muito mais bonito do que o normal. Aquele vermelho brilhava em seus olhos, era um presente ver aquilo. Ele olhava para o lago e, ao mesmo tempo, parecia que o lago estava olhando para ele. Parecia que o lago estava dentro dele. Parecia que ele era o lago.
Olhou para o céu e não podia acreditar. Parecia que ele tinha feito aquilo com suas próprias mãos. Sentiu uma intimidade tremenda com o céu, com o sol, com as nuvens. Todo o seu corpo se arrepiou e lágrimas desceram de seus olhos. Ele estava se comunicando com a natureza inteira! Mas não havia comunicação no sentindo convencional da palavra. Alguma coisa o tocava e era tocado por ele em tudo. Tudo parecia tão perto, tão íntimo, tão dele, tão ele. Era magnífico, e, por um breve momento, ele se esquecera de tudo. De quem era, das pessoas, de tudo. Não cabia espaço para mais nada.
Então sua memória foi retornando aos poucos. Ele foi se lembrando das pessoas, de onde estava, e de quem era. Ele não podia ficar com aquilo tudo só para ele. As pessoas tinham que ver aquilo também.
Correu para a cidade para espalhar a notícia de que o lago não era amaldiçoado, pelo contrário, era uma benção. O lago fazia o ser renascer divino. Contou para seus pais, amigos, irmãos, tios e até para as pessoas que ele nunca houvera conversado. As pessoas começaram a chamá-lo de louco, e dizer que ele queria os matar. Ele foi perseguido pelas pessoas, queriam que ele fosse preso. Então ele fugiu, correu em direção às montanhas, completamente frustrado e triste. Ninguém acreditava nele, pior que isso, mais uma vez ele fora rejeitado. Só que dessa vez era pior, ele não poderia mais voltar. As pessoas estavam desejando a sua morte.
Chorando, arremessou-se em um pedaço de rocha e encostou a cabeça de bruços. Apesar de tudo, ter o universo inteiro e ninguém para compartilhar não havia sentido. Era como estar no céu e sentir-se no inferno.
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Encostado na rocha de bruços, sentiu uma mão tocar em seu ombro. Era uma mão bem calorosa, e ao tocá-lo, uma energia amorosa percorreu o seu corpo. Então ele se virou.
Havia um ser, parecia humano, mas não dava para dizer se era homem ou mulher. Possuía cabelos compridos, loiros e encaracolados, longas asas brancas, e era de uma beleza extrema. Estava coberto por um manto azul. Uma luz percorria iluminando todo o seu corpo, e subia em direção ao céu. Não dava para ver o fim daquela luz. Parecia um anjo.
Aquele ser olhou fundo nos olhos do garoto. Era um olhar intenso e penetrante, mas não era desconfortável. Pelo contrário, era um olhar aconchegante. E, sem nada dizer, apenas olhando-o, o garoto escutou:
- Você tem que entender uma coisa: você não pode esperar que as pessoas acreditem em você agora porque você deu um salto além delas. Você atravessou o mar e chegou na outra margem. Mas você foi o primeiro a fazer isso e a descobrir que havia uma margem do outro lado do mar. Agora que você chegou lá, você está buscando por outras pessoas que também estejam lá... Isto é completamente tolo, porque sendo o primeiro, não há mais ninguém lá, apenas você.
Imagine comigo... Voltando há milhões de anos atrás, quando nós ainda nem existíamos e quando a maioria da vida era marinha. Imagine o primeiro peixe que conseguiu saltar para fora do mar para se tornar um anfíbio e respirar fora d'água. Se ele procurasse algum de sua espécia lá fora, ele passaria a vida inteira procurando e certamente morreria sem ter encontrado. Assim perderia a oportunidade de avisar aos outros peixes que era possível o salto, conseguindo então companhia para explorar fora do mar.
Talvez os outros peixes não soubessem que era possível saltar e ali permaneciam. Por alguma razão, talvez a curiosidade individual, este primeiro peixe saltou e descobriu que era possível. Então ele não pode esperar encontrar outros peixes como ele lá fora, porque ele foi o primeiro a sair. O mais sensato seria ele voltar, contar para os outros peixes que é possível sair do mar, incentivá-los a sair, aí sim quem sabe, ter companhia lá fora.
O que eu quero dizer é que o primeiro a dar um salto à frente de seus contemporâneos estará sozinho à princípio. Ele precisa estar consciente e aceitar isso, se não enlouquecerá. Se ele procurar por alguém como ele lá na frente, achando que irá encontrar, poderá passar por uma grande frustração desnecessária, perdendo um tempo precioso que poderia estar sendo usado para trazer outros de sua espécie também à frente.
Lembre-se: um peixe não pode puxar o outro para fora do mar à força, porque ele precisará se adaptar às novas condições e poderá morrer porque não conseguirá respirar de primeira - o choque será tremendo e ele não terá o tempo necessário para adaptar sua respiração. O peixe de fora, poderá apenas mostrar que é possível sair, incentivá-lo, e esperar que ele venha por si só. É ele quem deve sair. Talvez ele não consiga de primeira e retorne para o mar. Talvez ele não esteja preparado ainda e tentará sair novamente quando estiver. Talvez ele consiga sair e respirar lá fora. É impossível prever. Mas, sendo ele tentando por si próprio, ele não estará correndo tanto risco porque estará seguindo o seu próprio instinto. É melhor ter ele respirando no mar, do que ter ele agonizando lá fora sem respirar.
Esperar é uma virtude. Portanto não procure, espere. Mostre a possibilidade, incentive e aguarde. Sei que na outra margem a vida é extraordinariamente melhor... Mas lembre-se: é melhor você ter peixes respirando no mar, do que ter eles lá fora agonizando sem respirar.
~* Palavras que saíram da Boca.