- Vem cá - o mago chamou o menino.
O menino estava um pouco perturbado, atarefado. Parecia não haver tempo para concluir todas as tarefas. Cada vez aparecia uma coisa nova, e tudo começava a subir pelo seu pescoço, como se estivessem sufocando-o. Às vezes, dava uma vontade danada de jogar tudo para o alto e abandonar tudo de uma só vez. Mas sabia que isso era tolice. Não podia fazer isso.
- Aonde vamos? - ele perguntou ao mago.
- Vamos dar um passeio - o mago respondeu. - Vou te mostrar por que motivo os homens sofrem.
O menino ficou curioso. Óbvio que queria saber disso. Não podia negar que também sofria. Encontrar paz estava sendo algo muito difícil.
Eles saíram caminhando pelas ruas da cidade e chegaram até um terreno baldio, onde tinha um pequeno lago. Era um parque antigo, mas que por algum motivo, agora estava todo abandonado. E parecia que havia séculos que estava assim. Estava um caos total! As árvores cruzavam os galhos umas às outras, e o gramado estava enorme, invadindo o concreto e os bancos que abriam um caminho largo contornando todo o lago. O verde estava fora do comum, tomando conta de tudo. Os mosquitos sobrevoavam por todo o lugar.
O mago levou o menino até o local mais caótico de todos. Tinha um banco ali. Os dois se sentarem nele. Pareciam estar dentro de uma floresta de tão densa que estava a vegetação. Eles deram um tempo ali, em silêncio.
O menino começou a notar uma estranha alegria brotando por dentro. Uma alegria muito calma, quase um silêncio. Era algo harmonioso. Uma paz.
- O que é isso? - ele perguntou, estranhando aquela sensação que parecia não ter direcionamento algum.
O mago riu.
- Tem algum motivo para você estar sentindo isso? - perguntou ao menino.
- Não - ele respondeu. - Nenhum...
- Errado - o mago discordou. - Tem todo o motivo. Você está sentindo a alegria das plantas, das árvores e dos animais que vivem aqui. Todos eles estão felizes, porque puderam crescer. As árvores podem tocar umas às outras, podem oferecer caminho às formigas, e também oferecer abrigo aos animais que precisam delas. A densidade do gramado ajuda os predadores a encontrarem as suas caças. São sua camuflagem. Tudo está funcionando em ordem aqui. Cada parte tem a sua função. Está todo mundo feliz.
- Você é parte disso, por mais que não saiba ser. Se as árvores estão felizes, você fica feliz também. Se elas ficam tristes, você também fica triste. É um só espírito, apesar de haverem várias ramificações dele. Você é parte disso.
- Como você perdeu o contato com a natureza - ele continuou -, porque fica o tempo inteiro na cidade; perdeu também essa percepção. Você acabou esquecendo. Acontece com a maioria dos homens que vivem lá - ele apontou. - E é por isso que todos eles ficam meio loucos. Perdidos de si mesmos. Perdendo a paz.
O menino ficou um pouco confuso.
O mago abriu a mochila que tinha levado consigo e tirou de lá uma serra elétrica. O menino tomou um susto na hora, ficou morrendo de medo. Estava no meio do mato com um homem que falava coisas doidas, distante de qualquer outra pessoa normal. E o homem estava tirando da mochila uma serra elétrica? Por Deus! O que ele estava querendo fazer?
- O que é isso?! - perguntou com a voz trêmula.
O mago riu de novo.
- Calma, menino... só quero te mostrar uma coisa...
O mago ligou a serra e começou a cortar o mato. Cortou os gravetos que estavam no meio do caminho, e também os braços das árvores que as ligavam uma às outras. Os animais começaram a correr assustados, e os mosquitos se afastaram na mesma hora. O menino começou a sentir uma dor no peito. Um pavor intenso
O mago deixou o gramado todo ralinho, parecendo um piso de chão. Quando encerrou a tarefa, os dois se sentaram de volta no mesmo banco de antes. A única diferença era que agora podiam enxergar todo o espaço ao redor. Não havia mais aquele gramado denso.
Depois de algum tempo assim, o menino sentiu uma tristeza imensa. As lágrimas começaram a vir aos olhos. Ele queria chorar.
- Você está sentindo? - o mago perguntou.
- Sim... está triste... tudo triste... Para mago... para com isso...
- Exatamente - o mago confirmou. - Você agride a natureza, a natureza agride você; porque é uma coisa só. Você não está separado dela. Então, ao agredi-la, está agredindo você mesmo. Se ela fica triste, você também fica triste. Se você a faz sentir medo, você também sente medo. Se ela sofre, você também sofre. O único modo de você encontrar a felicidade, é começando a entender isso.
~ * Palavras que saíram da Boca * ~
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